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montesclaros.com - Ano 25 - sábado, 23 de novembro de 2024
 

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Mensagem: BELMIRA REZADEIRA

Ela veio dos rincões baianos para a terra de Figueira, na grande migração de 30. Chamava-se Belmira e morava na Rua Corrêa Machado, início do Bairro Morrinhos, em um barraco de taipa e barro. Próximo onde fica o Viaduto Manoel Emiliano.
Estatura média, mais para gorda, carapinha branca, em 1952 já com os seus oitenta anos, o rosto denotava severidade, mas dava gargalhadas estridentes, metálicas e assim era a sua voz que chegava a assustar. Retumbava pela vizinhança.
Nascera filha de escravos livres na Bahia de Todos os Santos e a arte da reza de benzer e de desmanchar mandinga aprendera com a sua avó Pulucena, uma iniciada nos ritos puros de candomblé na rama de “Cantois”.
Criava aves que circulavam por um acanhado quintal com uma moita alta de bambus e variadas espécies de plantas para chás, infusões, rezas e a arte de benzer. No centro da casa, no chão de terra, um fogão de lenha, circundado de pedras, sempre com uma panela de ferro no fogo.
Era o caldeirão da bruxa, o forno do alquimista, ponto de transmutação vibratória era lá que se preparavam às garrafadas, as contra mandingas, os banhos. Era onde se queimava o batú, e batia a ‘fundanga” africana A sua voz forte vibrava com os cânticos em dialeto das suas origens ancestrais.
Pelos cantos, tocos de velas acesas, de cera de mirindiba e pavio entrelaçado na gira da roda de Aruanda.
Minha avó paterna me confiava levar pessoas de suas relações, para uso dos serviços de Belmira Rezadeira. Eram hóspedes da pensão Serra Azul, gente vinda de Guanambí, do Morro do Chapéu, de Caculé, na Bahia e de BH, a capital de todos os mineiros.
Vizinhos, amigos, aflitos dos males do corpo e da alma. Crianças com quebranto, mau olhado, com doenças malignas. Senhoras com enguiço. Gente com ziquizira!
Ela avaliava o paciente visualmente antes do mesmo entrar na sua choupana e me dizia: “dá uma volta menino e depois vem buscar a pessoa-. Senta ele aqui que vai ser ligeiro. - Não entre que está carregado!” Sorrateiramente através das rachadoras nas paredes de bambu e barro eu assistia a tudo, mesmo a descarga pesada, para retirada de ovóides. Vi coisa do arco da velha! Gente botando sangue pisado pelo nariz, pela boca.
Quando entrava para apanhar de volta o consulente, chegava a sentir o “peso” no ar, o cheiro da “cuanga” que fora retirada, junto aos aromas da palha, das ervas aromáticas, do chão de terra batida No solo, as folhas murchas, resultado da limpeza e descarga vibratória do doente.
Crianças eram atendidas no colo da mãe, ou da acompanhante. Ela orava em Ioruba e soprava nos ouvidos do pequeno ser fazendo a manipulação, mantendo na mão um azeviche de ébano: “cosi oba can afí Olurum”! Num pequeno quarto de fundo, o seu Sanctun Sanctorum, o ‘altar de Oxalá”, o seu aledá, o ponto das firmações, e do culto a Santo Expedito.
Belmira faleceu em 1964, já quase centenária, sem nunca ter atendido a um telefonema. Dizia: esta instrumenga não é coisa de gente; é coisa de fuxico!

Raphael Reys

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