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Mensagem: O ´FOOTING´ DA RUA QUINZEA civilização chegou para nós, a cidade cresceu, os costumes mudaram.Surgiram os célebres ´barzinhos´ com os quais os jovens deliram. Tudo fácil e caríssimo.Surgiram as “paqueras´ em vez do ´flirt´ inocente (que hoje ninguém conhece) e é com muito dinheiro que se sustenta um namoro. Hoje, meus netos dizem, com a maior naturalidade: -´Para paquerar é preciso ter carro, vovó, a senhora está por fora, no dedão não dá´.Imaginem só, sem o cheirinho de gasolina a peso de ouro, nada feito e, para começo de namoro, dizem eles, o carro é imprescindível!Isto me deixa abismada! Sabem por quê? É que conheci a ´rua Quinze´, hoje Presidente Vargas, que era um espetáculo de beleza, alegria, agradável e deliciosa para os olhos e o coração. Era lá que começava o “flirt´, que se transformava em namoro, noivado e casamento. A ´Rua Quinze´ era a mola-mestra de todo romance daquela época.As moças (de todas as idades) muito arrumadas, perfumadas, impecáveis nos seus vestidos vaporosos, bem trabalhados, magnificamente femininas (não se usava roupas “jeans´ nem os sapatões de borracha e lona, os tênis que masculinizam as mulheres) nos seus elegantes saltos Luiz XV, cabelos longos e boquinhas de coração, surgiam aos bandos, de todas as partes da cidade para o animado```footing`` da rua Quinze.Desfilavam, sem pressa, alegremente para lá e para cá, da esquina do (hoje) conservatório até a esquina da rua Doutor Santos, enquanto rapazes formavam grupos maiores nos passeios, principalmente das Casas Pernambucanas, (hoje) Drogaminas, Casa LusoBrasileira (A Brasileira) Imperial Modas, (Drogão), que eram os grandes magazines daquela época. O horário normal era das 19 às 21 horas, mas, especialmente aos domingos prolongava-se até às 22 horas, sendo que a animação chegava ao auge.Ninguém ficava em casa, e com que ansiedade esperávamos aquele ´footing´!Durante o dia na Escola Normal, onde estudávamos, as colegas mais espertas e fofoqueiras chegavam com as novidades, gente nova na cidade: bancários transferidos, algum viajante charmoso e bonitão, balconistas recém-chegados (alguns portugueses) para a Casa Luso-Brasileira e as Pernambucanas, que sempre traziam rapazes de fora, mais experientes, para as movimentadas lojas.Isto era tão importante para nós, ´moças casadouras´, pois os rapazes eram raros na nossa cidade, a maioria estudava fora, de sorte que o número de mulheres predominava e estas noticias nos alvoraçavam. Sabíamos que, à noite, todos os rapazes da cidade e os forasteiros também estariam postados nos passeios, de um lado e de outro da ´rua Quinze´, ´chocando´ de olhos presos àquele atraente desfile.Bem no meio do quarteirão onde hoje é o Edifício Jabbur, ficava o bar de Sinval Amorim, muito movimentado e um dos melhores da cidade, pois era o único que vendia sorvetes, grande novidade daquele tempo. Ali os rapazes, na maioria viajantes com ares de ´granfinos´ se assentavam em volta de mesinhas, pediam cerveja e muitas vezes até se esqueciam da bebida, tão encantados e interessados naquele desfile de moças bonitas.1Era hora de analisá-las, fazer apreciações, comentários, comparações procurando descobrir a mais interessante, charmosa e bonita, e juro que era difícil!E como tinha moça bonita naquela rua Quinze! Eram famosas as montes-clarenses na sua beleza simples, sem sofisticação e os artifícios de hoje (as moderninhas que me desculpem).Contentávamos com muito pouco, e nem por isso deixávamosde fazer as conquistas.Nos dias de festas, célebres bailes da Escola Normal, ao som do saxofone do saudoso Tonico de Naná e o piano da inesquecível Dulce Sarmento, nós corríamos atrás das companheiras mais habilidosas que faziam nossas unhas (sem cobrar), prendiam nossos cabelos de cachinhos ou papelotes. O resto a natureza completava com os dons naturais que cada uma possuía, pois, não tínhamos salão de beleza.Enquanto desfilávamos muito compenetradas e conscientes do sucesso (desculpe a falta de modéstia), ouvíamos de vez em quando as exclamações elogiosas do Sinval Amorim, que nas suas galanterias e enorme simplicidade, não resistindo e admirado de tanta boniteza, exclamava bem gritado:- ´Vai ser bonita assim no inferno! Eta pedaço de muié bonita, isto é até abuso da natureza´!.Nós, lisonjeadas e contentes, continuávamos com o sorrisonos lábios e felizes.Qual a mulher que não gosta que ´se fale´ detalhadamentede tudo que é bonito nela?Tudo está tão longe! Naquele tempo tudo era imoral, até mesmo um simples toque de mão. A liberdade tolhida tornava tudo tão gostoso e o amor tinha um sabor de coisa proibida. Os olhares tinham sua grande linguagem e significação. Traduziam tanto!A ´paquera´ era diferente de hoje, tinha outro nome e era muito difícil... levava dias, até meses para se passar do ´flirt´ ao namoro.A rua Quinze era o ponto-chave dos encontros, era lá que rapazes e moças descobriam os eleitos do coração. Depois de se ´chocar´, de longe, tal qual ´jacaré´, mandava-se um bilhete ou um recado: ´Posso pegar o bonde?´ Isto queria dizer: poderia ele andar ao seu lado? Se a moça consentisse, ´ele´ se aproximava, todo cerimonioso e com ela descia e subia aquela doce rua, enquanto durasse o ´footing´ sob a proteção de uma colega que se prontificava a ´segurar a vela´, pois os pombinhos sozinhos, só depois de noivos e com aliança no dedo.Quando as férias chegavam e com ela os estudantes, o movimento aumentava e a rua Quinze parecia mais uma passarela de ´misses´ num colorido bizantino de uma alegria contagiante que até os senhores mais sizudos postavam-se também, nos passeios e se entusiasmavam, esquecendo-se, muitas vezes, que já eram ´papéis queimados´...Foi um tempo maravilhoso, e a Rua Quinze teve sua epopéia.E o que se gastava? Nada. Às vezes, num rasgo de gentileza, orapaz oferecia um pacote de balas à sua eleita, que nem sempre aceitava, pois, na certa, no dia seguinte, seria ´tesourada´.Entrar no bar do Sinval e tomar um sorvete com um rapaz só as mais ´despachadas´, pois, aquilo era considerado ´escândalo´. Às vezes morrendo de sede e com os pés formigando dentro do sapato naquela interminável caminhada, a moça com um ´muito obrigada´ punha ponto final nas pretensões de qualquer Romeu.Foi um tempo feliz, cheio de inocência e amor!Ninguém se preocupava tanto com as ´cifras´, a mocidadeera alegre, onde uma rua simples teve sua história, enchia e alegrava o coração de todos, e acredito que, hoje ainda, milhares de pessoas que aqui vivem lembram-se dela com lágrimas nos olhos e o coração partido de saudades!Cidade: Montes Claros/MGPaís:
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