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montesclaros.com - Ano 25 - terça-feira, 24 de setembro de 2024
 

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Mensagem: BOTECOS DE OUTROS TEMPOS...

´Seu´ Tito dos Anjos, quem não se lembra dele? Era manso como um cordeiro, e aquele comércio de cachaça do seu ´boteco´ era um paradoxo. Ele nascera para comerciar artigos mais delicados e inofensivos. Seu caixeiro, também, era esse mesmo tipo: Adail Sarmento, quem não o conhece? Tem uma paciência de jó. Extremamente pacato, era o Adail que atendia, todos os dias, a qualquer hora, o boteco cheio.
O Boteco do ´seu´ Tito tanto tinha de famoso como de pequeno. Entretanto, cabia tanta gente!
Os assíduos freqüentadores gostavam de uma ´pinguinha´ forte, um aperitivo daquela cachaça famosa que ´seu´ Tito guardava, escondida no fundo da prateleira, disfarçadamente, num litro sem rótulo, só para os fregueses do peito.
O prédio nada tinha de original, pelo contrário, era simples, mirrado, com portas estreitas e tortas, telhado colonial antigo, sem forro e o piso era de chão batido. Não oferecia nenhum conforto aos freqüentadores, entretanto, eles o viam como um paraíso, um lugar tranqüilo, gostoso.
Era lá o ponto preferido do Geraldo Freire e Waldir Oliveira, grandes poetas e jornalistas daquele tempo; Lúcio Narciso, falando sem parar e muito afobado; Nozinho Figueiredo, bonitão e elegante, sempre contando vantagens; Lourival Vieira, sempre preocupado com a valorização dos imóveis, de olho vivo nas ´sucatas´ dos prédios demolidos; Wilson Athayde, comprando e vendendo fazendas com os célebres ´negocinhos´; João de Paula, às voltas com o licor de pequi; Geraldo Veloso, com a eterna mania de garimpar; Meinardo, com o ´umbigo preso´ à fábrica dos Ribeiro Pires.
Esta turma reunia-se, diariamente, antes das refeições, para o célebre aperitivo temperado com as anedotas e piadas picantes que só esta turma unida sabia contar. As horas passavam despercebidas e eles saíam ´pisando alto´, enquanto as madames, em casa, aguardavam a volta dos maridos, cheias de mágoas e preocupações.
O almoço tão gostoso e caprichado, esfriava no canto do fogão enquanto os mosquitos, sempre disponíveis e de antenas ligadas, sujavam os talheres e pratos daquela mesa preparada para o ´chefão´...
As mulheres falavam, candongavam, choravam, limpando as lágrimas com as costas das mãos, implorando contra aquele inocente aperitivo, mas eles tinham um compromisso (de homem para homem) e não atendiam àqueles apelos.
Quando alguém da turma faltava, ficavam preocupados: ´O que será? ´fulano´ não apareceu, estará no camisolão? Vamos buscá-lo...´ E foi assim, por muito tempo, até que demoliram o Boteco, deixando a turma jururú, como galinha que perdeu o ninho...
O Boteco de Egídio (pai de Zim Boião), foi um dos mais antigos da nossa cidade, onde os montes-clarenses se reuniam para tomar caldo de cana caprichado, nos dias quentes, ou café muito gostoso, torrado em casa por sua sogra, Dona Pretinha, que também fazia as quitandas (era como se falava antigamente, tratando se de biscoitos, doces e bolos). Era a famosa quintandeira de nossa cidade. O Egídio era um homem simples, paciente, amigo de todos e, embora fosse tudo difícil naquela época, ele não deixava faltar o caldo de cana para os fregueses nos dias mais quentes, indo ele mesmo às chácaras mais próximas, trazendo nos ombros as enormes canas escolhidas bem molinhas e doces. Era excessivamente trabalhador, fazendo de tudo no boteco, sem nenhum preconceito ou vaidade.
Era lá o ponto de encontro dos famosos caçadores: Juquita, Abel Barroso, João Kincó, Pedro Veloso, Chico Branco, Chico Tófani, João Moreira que, como o Pantalião do Chico Anísio, deixavam os ouvintes boquiabertos com os fantásticos casos e proezas de suas caçadas
O café Columbia, de Uciço (todos o chamavam de Cícero) e a Agência da Loteria Mineira de ´seu´ Donato, na rua Quinze e Simeão Ribeiro. Os fregueses faziam rodinha no passeio, em frente, nessa esquina que ´pegava fogo´. ´Seu´ Donato nunca se afobava, e com o melhor dos sorrisos esperava tranqüilamente uma ´sorte grande´ para sua freguesia, enquanto Cícero, muito afobado, atendia prontamente.
Com desculpas de conferir seu bilhete e tomar o cafezinho do ´Columbia´, bem acompanhado de gostosos biscoitos, ali se encontravam e os assuntos da cidade eram ali ventilados, comentados, e a ´fofoca´ não perdoava ninguém. É para malhar? Vamos malhar...
Eram freqüentadores assíduos daquela esquina: Ducho, João Souto, Jabbur, Wanderley, Chico Tófani, Josias Loyola, Ernesto, Wilson Drumond, Marcelo Alcântara, João Camilo, Jader Figueiredo, Sinval e Santinho Amorim, Cesário Peixoto, e também, Cândido Canela e Antônio Rodrigues (mais novos), os famosos cômicos ´Chico Pitomba´ e ´Mane Juca´, que nos empolgavam com o seu programa caipira (na 1ª estação de rádio de nossa cidade, a ZYD 7) que nos deixou muita saudade.
Quanto esta turma estava reunida naquela esquina, as moças evitavam passar por ali, receosas de serem ´lembradas´ e ´comentadas´. Naquele tempo, dar a mão ao namorado era um escândalo, e beijar era caso de polícia... e pensando no velho ditado: ´voz do povo, voz de Deus´, ficavam ressabiadas.
Enquanto muitos botecos e bares desapareciam, com o tempo, outros surgiam, notáveis como: Café Galo (que era o café mais puro, pois o ´Galo´ comia o milho), Bar Sibéria, Café do Zé Periquitinho, mais tarde Leiteira Celeste, todos de gente amiga e que se esforçava para agradar a freguesia.
Dentre eles, salienta-se o Café do Zim Boião, que já é tradicional. Tendo ele herdado do pai as mesmas qualidades, segue a mesma linha, pois ´filho de peixe, peixinho é...”
Mas existe uma diferença. A turma hoje é bem diferente. Os freqüentadores do Zim Boião, todos eles, 2ª ou 3ª geração, já não se preocupam tanto com a vida dos jovens e dos outros, particularmente. A cidade cresceu muito, os valores são outros. Ninguém repara mais nos impulsos audaciosos dos jovens enamorados, nem no desequilíbrio dos casais e da sociedade, onde tudo hoje é natural e cabível.
Hoje, esta turma está mais preocupada com a situação do Brasil, na área sócio-econômica, a dívida externa (FMI), inflação, eleições diretas, sucessão presidencial e o futebol. Gente nova, mais ativa e inteligente, mentalidade aberta que sabe o que quer, gente que cresceu com nossa cidade, num meio mais civilizado e sonha com um Brasil melhor...
Atualmente, milhares de botecos enchem nossas ruas. A cada passo, a cada esquina se depara com um. Em qualquer portinha ou garagem imprensada abre-se uma ´lanchonete´. Mas mudou apenas o nome. A geração nova que me desculpe. Não acho graça nenhuma nestas tais lanchonetes improvisadas. São tão sofisticadas! Sucos, pastéis, sorvetes de mil qualidades, onde as essências e produtos químicos predominam, na maioria das vezes.
Não existe nelas o calor humano que se encontrava no Boteco do ´seu´ Tito e nos outros daquela época.
A cidade cresce. Ninguém conhece ninguém. Muita gente nova surge dia a dia, e dificilmente se encontra, quando se sai de casa, uma turma amiga, descontraída, menos preocupada com a inflação, poupança, investimento (cifras) para um bate-papo amigo ou um desabafo. Andam todos ocupados e distantes! As cabeças a mil por hora, agindo como computadores...
Enquanto isto, não custa nada sonhar - quem ainda pode fazê-lo - com um mundo melhor, e que Deus nos ajude a agüentar e segurar esta barra...
Cidade: Montes Claros/MG

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