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montesclaros.com - Ano 25 - domingo, 24 de novembro de 2024
 

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Mensagem: MINHA MÃE, A STRIPER, O VELÓRIO, O LIVRO E A BELA DOLORES
Mais uma vez, no dia 22 de maio de 2006, em que meu irmão caçula, Xandão, completava 59 anos, fui obrigado a viajar, às pressas, para minha aldeia. Recebi a notícia de que minha mãe estava internada num Hospital. Pelo que me disseram, imaginei que, desta feita, a coisa seria muito mais grave e cheguei até a pensar na possibilidade de uma despedida. Estava me recuperando de uma microcirurgia de catarata senil, em que trocara o cristalino do olho direito por uma lente alemã, com a do outro olho programada para o próximo dia 28, a apenas seis dias do da viagem. Mas mãe é mãe. Não consegui vôo e saí, à tardinha, de carro. Quatrocentos e vinte quilômetros de estrada precariamente transitável, menos no trecho compreendido entre Francisco Dumont e Engenheiro Navarro, onde topei com várias crateras no asfalto. Até caí numa delas. Dei sorte. Não houve problemas. Onze e meia da noite estava beijando minha mãe num apartamento do Prontocor. Apesar de minha insistência ela não quis que eu dormisse ali, preferindo a companhia da sobrinha Candinha, alegando que, assim, teria mais liberdade. Cansado, rejeitado, faminto e ao mesmo tempo feliz, despedi-me dela e da prima e saí à procura de um restaurante. Só que eles, naquela madrugada de quarta-feira, já estavam fechando ou vazios. Um garçom me disse que havia uma boate espetacular, no caminho do aeroporto, onde eu poderia até jantar. Resolvi encarar. Entrei num imenso portão de um gigantesco pátio que serve de estacionamento. Dois “armários” me receberam com a maior educação e me deram uma cartela branca. Por um imenso e artístico corredor, cheguei ao salão. Lindíssimo. Vários planos circulares de poltronas estofadas, com uma imensa pista de dança ao centro, excelente som e lindas mulheres. Não deixa nada a dever às mais sofisticadas boates de outras plagas. Até nisso minha aldeia me orgulha. Não estava a fim de paquerar ninguém e fiquei ali, tomando meu uisquinho, esperando o prato que pedira. Vi três shows. Foi então que anunciaram a estrela da noite: uma linda strip-teaser paulista que já havia sido capa de várias revistas do país. A moça se apresentou com muita arte. Depois, certamente imaginando que aquele desconhecido, careca, gordo, alto e sexagenário, poderia ser um daqueles coronéis do interior, cheio da grana, aproximou-se de minha mesa e sentou-se, no estofado, a meu lado. Tratei-a polidamente, mas ela, como toda paulista, foi muito apressada. Sem a mínima fumaça sequer de amor bandido, foi logo me pedindo oitocentas pratas por um programa de uma hora, num dos apartamentos que, informou, havia aos fundos da boate. Não resisti à tentação e, quando me dei por mim, já havia respondido que nós, montes-clarenses, cobrávamos, principalmente de apressadas prostitutas forasteiras, oitocentas pratas, por hora, só para batermos um papinho com elas. A bela atriz, perplexa e desarticulada, tratou logo de chispar e sair, sem graça, em busca da sobrevivência noutros recantos. Comi meu palmito com carne de sol, pedi e paguei a conta, saí da boate e fui dormir sozinho, num apartamento do Motel Sonotur, de meu saudoso amigo Afrânio Tempone. Acordei cedo, tomei aquele banho e retornei ao Hospital, passando, antes, pelo Café Galo, onde abracei Jadir e saboreei um copo grande de café com leite com aquele delicioso pastelzinho de carne. Mal sentei naquele gostoso banquinho de madeira que fica encostado a uma das paredes laterais, vi um panfleto com a foto de uma mulher quase nua. Era justamente a atriz paulista. Contei a história a vários amigos que ali se encontravam, dentre eles o grande escritor Haroldo Lívio (de quem sou admirador há muitos anos e que, só naquele momento, descobri ter olhos azuis) e sua cria literária, Raphael Reys, a quem eu conhecia apenas de vista e de quem sou aficionado leitor, no Mural do Paulinho Narciso. Haroldo se retirou e Raphael e eu continuamos a conversar sobre vários assuntos, inclusive sobre sacerdotisas de Cotito, até sugerirmos, um ao outro, escrever crônicas em homenagem às cinco mais importantes de Montes Claros: Roxa, Anália, Leobina, Zinha e Edna. Raphael até já me mandou uma, sobre Roxa, por e-mail.
De volta ao Hospital descobri que a causa da internação de minha mãe, mais uma vez, fora uísque misturado a potentes medicamentos. Seu médico, André Antunes, sobre ser competentíssimo, parece um santo de tão bondoso. Minha mãe me perguntou onde eu dormira. Respondi que no Motel de Afrânio. Ela, maliciosamente, só olhou pra mim e exclamou: – Esse meu filho não toma jeito, mesmo! Retruquei, citando o filósofo Zé Amorim: – “Antimônio não pega solda”. Aí pedi a André que, se fosse possível, diminuísse a potência dos remédios de minha velha e permitisse que ela tomasse mais alguns uísques. Ao que ele, sorrindo, respondeu: – Uísque, não, Bala, mas um bom vinho, moderadamente, seria até bom para a saúde dela. André foi cuidar de seus outros pacientes e eu fiquei ali a meditar sobre a velhice: será que vale a pena a gente se privar dos prazeres e morrer cheio de saúde? Não seria bem melhor morrer sem saúde? Gastá-la nos prazeres da vida?
Iran Rego, um dos fundadores do Hospital (que tem um belo busto de Mauricinho num jardim de entrada), veio visitar sua “tia” Maria Helena. O irmão dela, tio Luiz Quintino, com mais de cinqüenta anos de medicina e oitenta de idade, estava no quarto. Liguei a Guilherme, meu irmão, também médico, e disse a ele que, Iran, tio Luiz, e eu havíamos feito um acordo: a partir daquele momento, menos remédios e mais bebida para nossa querida mãe. E deixo aqui um bom conselho a todos: se algum dia, algum remédio atrapalhar seu prazer de beber, elimine o remédio. E apelo às gananciosas multinacionais da farmacologia que passem a fabricar remédios compatíveis a esse prazer.
Almocei no Automóvel Clube, com meu parente pelo lado dos Quadros, amigo e colega de faculdade, Antônio Soares Dias e com a repórter Márcia Vieira, de sua emissora de rádio, que me entrevistara. A moça quase não pôde dizer nada. Ficou, o almoço inteiro, ouvindo aqueles dois carecas, parecendo meninos, relembrando fatos de suas juventudes.
Só vim a me entristecer quando, à noite, Paulinho Narciso me deu a notícia da morte de meu grande amigo Antônio Augusto Athayde, nosso querido Totone. Mas a verdade é que até em velório de amigo a gente sente algum prazer. E no de Totone tive alguns como o de dar um fraterno abraço de pêsames em sua esposa, Lúcia, o de conhecer alguns jovens da família, o de rever a irmã de Totone, Aparecida (linda como sempre) e seu marido Zé Carlos (aquele companheiro cultíssimo, que parece um lorde britânico e que lutou intensamente pelo progresso de nossa aldeia), o de rever Cássio Athayde e Mary, o de abraçar meu “cumpade” Vila Pereira, o de abraçar meu querido amigo Fábio Rebello e o de mandar um grande abraço a Pedro Prates, por intermédio de Andréia e Tila. Totone, minha gente, foi uma figuraça. Seu coração, um dos mais bondosos de toda nossa tribo, sempre guardava um lugarzinho especial para os mais jovens, inclusive para mim. Tenho gratíssimas lembranças de nosso convívio, inclusive uma cinqüentenária foto, ao lado dele, na Vaca Brava, que hoje publiquei em meu site.
Na manhã seguinte, em que Totone baixou à sepultura, minha mãe recebeu alta. Levei-a à sua casa e passei o dia com ela. Jantei uma deliciosa bacalhoada portuguesa, no restaurante de meu saudoso amigo Armando Português, acompanhado pelo ilustrador de meu último livro, o artista plástico Juarez Azeredo Dias Costa, cujo pai, Fernando Dias Costa, ex-Reitor da Unimontes, a quem eu assessorara juridicamente, fora homenageado nas festas das comemorações dos quarenta anos da instituição. Revi meu caro reitor Paulinho, Marina, Tião Vieira e conheci a nova, culta e alegre turma da Unimontes. Na noite seguinte Berguinho autografaria seu belíssimo “Quase História”. Já havia comparecido ao lançamento, em Belo Horizonte, no Palácio das Artes, mas resolvi ficar mais um dia, para ir, mais uma vez, ao encontro dele. Num imenso salão revi gente boa que não acabava mais. Alguém me pediu para fazer uma comparação dos dois lançamentos. Respondi que no de Belo Horizonte havia mais gente, mas não tanto calor humano. Como Berguinho é querido em Montes Claros! Tirou até Robertão Gomes da toca. Já li o livro. É ótimo e será, num futuro bem próximo, grande documento para as gerações porvindouras (quando escrevo essas duas palavras me dá uma tremenda saudade de Cândido Canela) estudarem o passado. E foi justamente por isso que Roberto Elísio, em sua bela crônica dominical sobre o livro, chamou Berguinho de “testemunha ocular da história”, parafraseando o slogan de abertura do antigo Repórter Esso. Roberto disse, ainda, que Berguinho, de Espinosa, adotou Montes Claros. Devo dizer a meu querido amigo-irmão que Montes Claros também o adotou, por um projeto de minha autoria, quando fui vereador e líder do Prefeito Toninho Rebello.
Depois do lançamento fomos a uma bela churrascaria. Fiquei papeando com Haroldinho e com ciúmes de Robertão, porque ele, ao invés de sentar-se a meu lado e de nosso Chefe, preferiu a cadeira ao lado de Zé Augusto Alkmim. De repente chega a moça que eu considerava a mais linda de minha aldeia, no meu tempo de rapazinho. E eu não estava sozinho nessa opinião, que era também a de Konstantin, que a retratou numa tela. E a moça continua linda. Estava com um de seus filhos, um belíssimo rapaz. Falo de Dolores Alkmim. Não via aquela beleza, ao vivo, há mais de três décadas. De repente bateu um tremendo cansaço. Bala Doce você não é mais aquele, pensei. Maçarico, gentilmente, acompanhou-me até meu carro. Fui dormir na casa materna. Acordei e peguei estrada de volta, pensando na cirurgia programada. E aqui estou, preparando-me para operar o olho esquerdo, para que eu possa ver com mais nitidez ainda a incomparável beleza da gente de minha aldeia. E devo dizer a meus leitores que estou orgulhoso pelo fato de que meu cirurgião é um jovem, meu sobrinho Carlos Gustavo, cujo nome de guerra na profissão, aqui em Belô, é Dr. Vieira. Daqui a quatro horas estarei na Clínica. Axé!

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