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montesclaros.com - Ano 25 - terça-feira, 24 de setembro de 2024
 

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Mensagem: Caleidoscópio de uma cidade<br> “O vazio sempre foi minha preocupação constante;<br> e eu considero que, no coração do vazio como no<br> coração do homem, as chamas ardem.” (Yves Kleim)<br><br><br>Escrevo o que transborda do coração. Recebi de minha amiga Mary Pimenta, um e-mail emocionante sobre os anos 50/60. Imediatamente senti uma vontade, irreprimível de escrever, apesar do adiantado da hora. Plena madrugada, silêncio. Só a chuva miúda lavando a saudade. <br>No interior, a vida corria menos depressa. As relações eram mais próximas. A convivência direta entre as pessoas acontecia em toda Montes Claros. “A vida era subir Presidente Vargas e Dr. Santos, descer Camilo Prates e Dr. Veloso em direção a Praça Dr. Chaves.” Cercando a cidade os Montes Claros. Morenos na seca e verdes nas águas, envolvidos pelo céu mais azul que já vi. <br>A Rua Presidente Vargas era o point da cidade. Em suas imediações o Cine São Luiz, o café de Zim Bolão – guardando as devidas proporções- tão importante para a cidade como o café De Flore para Paris. As melhores lojas, a loteria de Seu Donato Quintino, o prédio da ZYD7. Um casarão destacava em suas imediações: o Mercado Municipal, com seu relógio marcando as horas dos montes-clarenses. No bar de Zim Bolão, conversava-se Tete a Tete de um tudo. Lá, as idéias efervesciam. Debatia-se política, intelectuais discutiam as novas correntes filosóficas, o povo discutia futebol, filmes eram comentados. Seu Santinho Amorim, cinéfilo de carteirinha, era um crítico singular. Comentavam com ele: - Que filmão, hein Santinho? Ele respondia: - Supimpa! Outro aproximava e dizia: - Que filme péssimo! Ele respondia: - Podre! E tomava o caminho de casa, rindo baixinho...<br>Todos se conheciam, trocavam impressões, expressavam pontos-de-vista sobre tudo quanto havia de mais intenso na cidade e no mundo. Uma sensação unânime também paira sobre aqueles que viveram a Montes Claros dos anos 50/60. Festas nos clubes sociais, horas dançantes em casas de famílias, piqueniques nas fazendas. E a Praça de Esportes? Local onde grandes desportistas se destacaram na natação, no vôlei, no basquete. Aconteciam os campeonatos do interior. Torcidas organizadas, a rivalidade entre Montes Claros e Diamantina. Nossos atletas, sendo respeitados no Estado. Como esquecer as cortadas de Zembla Melo, Marlene Almeida, Moema Versiani, Luci Paraíba. Elas viravam qualquer jogo, junto com as levantadoras Luci Almeida, Glória Bogatzki, Vilma Gonçalves, Teresinha Fróes que, sob a batuta de Seu Pimenta elevaram o nome de nosso burgo. Outra sensação unânime também paira sobre aqueles tempos. Parece que as horas passavam mais devagar e tínhamos condição de ler mais, comentar os “filmes–cabeça”. Estávamos sempre em busca de algo que nós mesmas não sabíamos o que era. Participávamos do movimento estudantil, fazíamos cadernos de poesia, de recordações, de receitas, antevendo o casamento, sonho da maioria...<br>No Diretório Central dos Estudantes, sob a presidência de Vanderlino Arruda, germinavam sementes que nos tiravam da alienação e nos tornavam mais conscientes do nosso papel na comunidade. <br>Os eventos mais comentados da época eram o baile do suéter, onde se elegia a Miss Suéter, a rainha dos estudantes, a rainha e as princesas do Tiro de Guerra 87. A rainha do Algodão e a rainha do Centenário, cuja escolha recaiu sobre Maria Luísa Veloso Costa (Bisa), uma das moças mais bonitas da cidade, hoje, já encantada. <br>Mas a grande pedida, era dançar nos clubes sociais, onde a paquera rolava solta. Se sobrava algum dinheiro, cotizava-se e íamos comer um churrasco delicioso no Mangueirinha, ao som de Matinata, Torna a Sorriento, Volare, Only You. Era uma geração ingênua. Tudo era emoção, sonho e ilusão, apesar de sentir no ar as primeiras aragens do movimento feminista. <br>Lia-se na Gazeta do Norte, as encantadoras crônicas de D. Ivone Silveira sob o pseudônimo de Simone. O “Jornal de Montes Claros” – celeiro de grandes jornalistas – iniciando sua trajetória de grande tiragem e credibilidade. “Tu Peixoto” escrevendo sobre a sociedade numa seção chamada Notas Sociais. Lazinho Pimenta, na Gazeta do Norte, depois no Jornal de Montes Claros, retratava a sociedade num estilo a la Jacinto de Thormes. Descrevia com classe e ética os eventos sociais da época. Era uma coluna democrática! Nela havia espaço para todos os estamentos sociais, desde que fossem importantes para a cidade. <br>Naqueles tempos as moças freqüentavam os estádios. Os embates entre o João Rebelo, depois Ateneu e o Cassimiro de Abreu movimentavam as tardes de domingo. Lembro-me da inauguração do Estádio João Rebelo. Foi o maior sucesso! O Fluminense do Rio de Janeiro veio para jogar com o Ateneu. À noite os jogadores foram passear na Rua 15. Foi a maior tietagem. Telê, o mais bonito e charmoso, Castilho, o goleiro de sobrancelhas fechadas, Píndaro, o mais simpático e educado, Pinheiro e outros que não lembro. <br>Nos anos 50/60, artistas da Rádio Nacional vinham apresentar-se em nossos palcos e clubes. Dalva de Oliveira – divina Dalva – Cauby Peixoto, que enlouquecia a platéia cantando “Conceição”, Emilinha Borba, Virgínia Lane e suas vedetes, Baden Powell, Esther de Abreu, Ângela Maria, Luís Gonzaga. Todos recebidos com “Pompa e circunstância”. <br>Em clima de Carlos Drummond de Andrade, me pergunto: E agora, Carmen?<br>“A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou.” Para onde você vai?<br> No silêncio da madrugada, a chuva miúda acalmou a saudade, o vazio, a ausência da terra natal. A tentativa de retornar ao passado, à juventude perdida, lembra outro verso. “Quer voltar à sua Montes Claros? A sua Montes Claros não existe mais.” Eu teimo e digo que existe. E a reencontro na memória, na escrita e ganho força para viver bem o meu hoje, o meu agora. Refiz roteiros, não esmoreço. Meu caleidoscópio de imagens está ao meu alcance a hora que quero. Carmen Netto Victória<br> <br><br>Esta crônica é dedicada à Zilca Prates Tolentino e Carlos Meira.

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