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montesclaros.com - Ano 25 - domingo, 22 de setembro de 2024
 

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Mensagem: Nossa Festa de Agosto

Ruth Tupinambá Graça

Toda a cidade se movimentou e a Praça Portugal foi magnificamente preparada para receber o Cortejo Principesco das Festas de Agosto, com os Reinados de Nossa Senhora, São Benedito e o Divino Espírito Santo.
A Prefeitura e a Secretaria de Cultura prepararam com entusiasmo a decoração da cidade, principalmente a Praça Dr. Chaves e a Praça Portugal.
Foi um espetáculo maravilhoso. Os Reis, Rainhas, Príncipes e Princesas, pequeninos, desfilaram compenetrados representando figuras tão importantes.
O cortejo muito luxuoso, as mães se desdobram no aprimoramento das fantasias sedosas e brilhantes para este pomposo desfile ao som da música, tambores e pandeiros dos catopês, marujos e caboclinhos.
Vendo este tão brilhante desfile, com tanto luxo, eu me lembro das Festas de Agosto, quando nossa cidade apenas engatinhava, tão pequena, simples e acanhada... entretanto estas Festas eram magníficas, embora com menos luxo e satisfação.
Não só porque o povo era extremamente católico, como também a cidade não tinha outras distrações, estas Festas eram um grande acontecimento.
Os três dias eram considerados “dias santos” e toda a cidade parava. As Escolas e o Comércio fechavam para homenagear os Santos Padroeiros e acompanhar os festejos.
Os festeiros eram escolhidos por sorteios e muitas vezes os contemplados eram famílias pobres (mas não recusavam) e para fazer a festa toda a comunidade colaborava com dinheiro e mantimentos e a festa se realizava com o mesmo brilho e entusiasmo.
Um mês antes, a noite já se ouvia o som dos tambores dos catopês nos ensaios e visitas aos festeiros, onde eram recebidos com café e bebidas. Nestas alturas as famílias já providenciavam roupas e sapatos novos e diferentes para os três dias de festa. O comércio (parado o ano todo) se agitava e os comerciantes mostravam-se felizes, enquanto as prateleiras se esvaziavam e desde as fitas até as sedas e crepes (encomendadas para as festas) eram milagrosamente compradas pelas mães que se esmeravam nas “toiletes”. Na casa dos festeiros o movimento não era menor: frangos, perus, leitões já bem tratados, permaneciam nos grandes quintais engordando e esperando a morte. Os banquetes das Rainhas (como diziam) eram nos quintais e à sombra das enormes e centenárias mangueiras, improvisavam mesas com largas tábuas sobre cavaletes de madeira. O almoço era para toda a população. Os fazendeiros da região com suas famílias deslocavam-se para a nossa cidade afim de acompanhar os festejos. Os catopês, marujos e caboclinhos eram muito valorizados, tinham mesa de destaque ao lado das Rainhas. As mesas cobertas com toalhas bem coloridas, abarrotadas com os melhores quitutes mineiros: tutú com lingüiça, arroz com carne de sol (de dois pelos) costelinhas de porco, baciadas de farofas (de miúdos frango e leitão assados, perus com os papos estourando de recheios, muito molho com pimentinhas de cheiro, etc. E quanta fartura! Todos comiam à vontade enquanto as cozinheiras iam reformando os pratos. Era comida para ninguém botar defeito. A cerveja, o vinho “cinzano”, e a “pinga” eram o delírio dos catopês que, (tirando a barriga da miséria) se esbaldavam e abusavam, muitos até se embriagavam e de voz arrastada mal conseguiam cantar e sustentar os tambores.
Durante estes três dias de festa, muita coisa acontecia em casa da Rainha: muitos namoros iniciados ali, prolongavam-se, às vezes, davam em casamento. (Haja visto o casamento do Dr. Cyro dos Anjos com a “Menina do Sobrado” (Lilita) começou na casa da Rainha quando José Correia Machado foi o Rei de São Benedito de Dona Bela a festeira.) Rapazes engastorados de terno e gravata, acompanhavam tudo, de olho na namoradinha que, toda dengosa, lambiscava uma coxa de frango e estalando nos dentes as peles torradinhas e deliciosas.
A sobremesa, todos já sabiam do sistema. Havia um “quartão” com latas e pote cheios de doces de leite, de casca de laranja, de limão , de figo, de mamão e coco. Era só chegar na porta e receber o prato com todas as variedades. Todos ali se aglomeravam e as mãos ansiosas procuravam agarrá-los. Tumultuava um pouco, mas com paciência, todos recebiam seu quinhão.
Durante toda tarde a casa da Rainha era movimentada. Gente entrando e saindo, ninguém perdia aquele “almoção”.
Mais tarde era a vez da “Cavalhada” na Praça da Matriz. Um maravilhoso espetáculo que hoje já desapareceu do programa das Festas de Agosto. É uma pena pois só quem a conheceu pode falar da importância e beleza daquele acontecimento.
Mas a cidade foi crescendo e a Festa de Agosto foi desaparecendo, aos poucos, e durante muitos anos ela passou despercebida quase esquecida, entre as décadas de 40 e 50 mais ou menos. Só uma minoria, (gente mais simples) acompanhava aquele Reinado sem expressão. Os catopês, coitados fazia pena vê-los dançando, mal vestidos, alguns até descalços, com roupas rôtas, capacetes descorados, fitas rasgadas, acompanhando um Reinado tão decadente. A Festa de Agosto agonizava e o nosso Folclore também.
Eu presenciei de perto este desmoronamento. Graças ao Dr. Hermes de Paula, grande batalhador pelo nosso Folclore, incansável historiador, com o apoio da Prefeitura e o Conservatório (que muito o ajudaram) lutou cheio de entusiasmo, dedicando todo o seu tempo, incentivando a população, arcando com as despesas de roupas, instrumentos e indumentárias para os catopês e reorganizando os Ternos de Nossa Senhora, São Benedito e o Divino Espírito Santo, conseguindo ressuscitar a Festa de Agosto e também levantar o nosso Folclore que é hoje universalmente conhecido e admirado. Naquele ano a Festa foi linda. D. Hermes foi o festeiro e sua filha Valéria, Rainha de São Benedito. A Festa foi em sua residência, onde ele recebeu todos, com muita alegria. À partir daí, a comunidade se entusiasmou e as Festas de Agosto continuaram normalmente, com as mesmas tradições. Mas hoje, com tristeza, eu noto que já não se faz a Festa como antigamente. Falta entusiasmo da comunidade. A Prefeitura e Secretaria da Cultura se desdobram, se esforçam mas há pouca adesão. Apenas um grupo de parentes e amigos dos festeiros participam dos festejos e do almoço das Rainhas. O movimento tornou-se mais comercial, quando barracas de comidas, bebidas e milhares de artigos são vendidos, abarrotando a Av. Cel. Prates, no afã de conseguir lucros tirando quase que totalmente as características desta Festa. A comunidade precisa se entusiasmar e prestigiar mais a nossa História, nosso Folclore, lutar para que esta Festa seja tradicional e não comercial.
Tenho receio que ela perca suas características e seja novamente sufocada como no passado.
Não temos mais o Dr. Hermes de Paula para lutar e gritar (como sempre o fez) por nossa cidade, Sua História, Sua Gente.

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