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montesclaros.com - Ano 25 - domingo, 22 de setembro de 2024
 

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Mensagem: CIDADE DIVIDIDA<br><br>Ruth Tupinambá Graça<br><br>A nossa cidade foi durante muito tempo, automaticamente divida em duas partes:<br>“Parte de cima´ e “Parte de baixo”.<br>A cidade era pequena, poucos habitantes e a linha divisória era o Mercado Municipal (na Praça Dr. Carlos) partindo-a ao meio.<br>A princípio esta divisão era apenas para ressaltar a parte antiga da cidade, onde começou com a sua primeira casa, a Igreja Matriz, o Palácio Episcopal, Câmara Municipal, a Cadeia e os belos sobradões, pertencentes às famílias tradicionais, daquela época.<br>O Mercado Municipal (que para nossa tristeza foi demolido) foi construído a duras penas, pelo esforço dos habitantes da parte de baixo, que se empenharam numa luta ferrenha com recursos angariados através de uma lista de doações voluntárias, corrida de porta em porta.<br>Meu avô Cassimiro Mendonça foi talhado de estróina e gastador, por ter encabeçado a lista referida, com a quantia de 200 mil reais (moeda da época).<br>Depois de pronto e inaugurado com muita cerveja, música e foguetes, referiam-se ao Mercado com muito orgulho, ressaltando o grande benefício que o mesmo prestava a nossa comunidade.<br>Funcionava diariamente, portas abertas ao “povão”, com suas lojas armazéns, botequins e aos sábados a grande feira (em toda sua volta) que era um espetáculo para os olhos e um grande “alívio” para os bolsos, pois havia de tudo com fartura e preço acessível.<br>Os habitantes da “parte de baixo” que eram naturalmente os mais antigos da cidade, pertencendo a famílias tradicionais e que chegaram primeiro, viram a cidade crescer, acompanhando “pari passus” seu desenvolvimento, lutando bravamente pela “Princesa do Sertão”.<br>Os da “parte de cima”, gente que veio chegando mais tarde, deslocando-se das fazendas, cidades vizinhas, foram construindo casas melhores, mais modernas, pensões, farmácias e lojas (no afã de ganhar dinheiro) numa cidade que florescia e prometia muito, foram se localizando na parte e cima à medida que a cidade crescia.<br>Daí começou a animosidade entre as duas partes e o bairrismo tomou proporções tão fortes, envolvendo a parte social e política da cidade, numa rivalidade preocupante que durou muitos anos.<br>Formaram-se então o “Partido de Cima” e o “Partido de Baixo”, ou seja: os Estrepes e os Pelados.<br>Os de cima não toleravam os de baixo. Eram prepotentes e julgavam-se superiores e os de baixo por sua vez, pertencendo a famílias tradicionais, mais antigas, gente que estudou em Diamantina, (centro mais civilizado da época) professores, coronéis e doutores, julgavam-se “donos do pedaço”.<br>Acontecimentos políticos e sociais com graves conseqüências, vinganças e até mortes, prejudicavam as famílias. Tudo era dividido ostensivamente: um rapaz do lado de cima não poderia namorar com uma moça do lado de baixo e vice-versa.<br>Em virtude dessas proibições aconteceram muitos casos de fugas (em altas horas) de donzelas da sociedade para encontros desejados e proibidos.<br>A Elza, uma garota linda (no esplendor dos seus dezoito anos) morena de olhos castanhos e uma farta cabeleira ondulada, que emoldurava em rosto perfeito, apaixonou-se por (...), rapaz também jovem, bonito e educado e que correspondia o seu amor na mesma medida. Seu único defeito era pertencer ao partido contrário e o pai da Elza não consentia aquele romance.<br>Certa noite a inocente a Elza deu uma escapulida, e às escondidas, correu para os braços do seu grande amor.<br>Seu pai descobriu a fuga. Naquele tempo (em que filho não desobedecia os pais, nem tinham vontade própria) o inocente encontro tornou-se um escândalo.<br>O pai sentindo-se traído e humilhado perante a sociedade e pressionado pelo “partido”, resolveu castigá-la dando lhe uma grande surra.<br>No dia seguinte foi uma tragédia em casa da Elza e todos choravam.<br>Ela desesperada, achou que a única solução da sua vida era a morte, o suicídio. E assim o fez: ingeriu soda cáustica que a levou a morte rápida. Foi um caso extremamente doloroso e que abalou a nossa cidade.<br>O “Romeu” da tragédia ficou muito triste e abalado com o desfecho de um tão grande amor. Mas que fazer?<br>Ele não teve culpa. O tempo se encarregou de apagar aquela triste recordação, tanto que mais tarde se casou com uma bela moça (do seu partido) e constituiu uma bela família.<br>Nestas alturas somente o Mercado era freqüentado pelas duas partes, portanto ninguém se espantava ou se admirava, quando de repente, quando ali surgia uma discussão, uma briga e até tiros, era a intolerância e impertinência era choque entre os Estrepes e os Pelados.<br>Mais tarde isto passou como um sonho (ou pesadelo) e pouca gente hoje se lembra destas histórias, destas rixas de cidade pequena.<br>A cidade cresceu, novas gerações surgiram, mais evoluídas, mais civilizadas.<br>O progresso chegou trazendo nova cultura influenciada por alunos de cultura influenciada por alunos de faculdade, formandos e formados, professores, escritores, poetas e sonhadores.<br>A fatal animosidade e o “coronelismo” desapareceram e a civilização veio transformando a Princesa do Sertão em rainha do Norte de Minas, onde era lugar para todos os montes-clarenses e forasteiros, numa convivência tranqüila, todos trabalhando e acumulando riquezas, agindo com o coração, amando e respeitando esta Terra abençoada, exaltando sua música, sua cultura, seu folclore... Os poetas, os românticos continuavam admirando a lua, com as serenatas ao som do choroso violão.<br>As duas partes, “de cima” e “de baixo” se uniram finalmente formando uma grande e forte corrente, cujos elos envolventes prendem e enfeitiçam a quem desta cidade se aproxima.

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