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montesclaros.com - Ano 25 - domingo, 19 de maio de 2024
 

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Mensagem: Vox populi, vox dei”

Ruth Tupinambá Graça


Abrindo o jornal deparei-me com uma noticia alvissareira que causou-me grande alegria.
O Prefeito Tadeu Leite interrompera o desmatamento da Serra do Sapucaia.
A “ferida” enorme provocada pelos tratores em seus pés, causou uma grande revolta em todos os montes-clarenses e o pior é que este ato absurdo não era ilegal.
A Prefeitura autorizara vendendo 3 lotes à Associação dos Arautos do Evangelho no loteamento do Ibituruna, aprovado em 2/3/2004. Em 2008 a Administração passada declarou a referida Associação como entidade de utilidade pública, o que facilitou o desmatamento que, aos poucos, ia acabar com a beleza dos montes que rodeiam nossa cidade. Em 2009, com posse da certidão emitida pelo Prefeito de Moc, os Arautos começaram o trabalho com tratores.
Mas é certo o ditado: “Vox Populi, Vox Dei”.
(A voz do povo é a voz de Deus)
Surpreendido positivamente, o Prefeito - sensibilizado com o clamor do povo - num ato de magnitude acabou de vez com a “tragédia”, propondo aos “Arautos” uma troca de terreno (o que foi logo aceito), acabando assim o pesadelo que angustiava todos nós.
Mas, acreditem. Enquanto os tratores, impiedosamente, jogavam por terra aquelas árvores centenárias - afugentando os pássaros, atirando longe seus ninhos e seus filhotes... Eu sofria.
Da janela do meu quarto (sétimo andar) eu via aquela cratera e me revoltava. Não me conformava vendo desaparecer toda a beleza daquele morro.
As lembranças logo se afloravam em minha mente ao ver aquela serra tão maldosamente arrasada. Na certa, outros lotes seriam vendidos e os desmatamentos acabariam descaracterizando a nossa cidade, acabando com os montes que lhe deram o nome.
Eu não queria que isto acontecesse. Conservava na mente toda a beleza daquele lugar, quando ali mesmo - onde hoje são os bairros nobres - outrora foi a “Fazenda do Melo”, propriedade do Dr. Santos, aquele grande homem, médico, que foi prefeito da nossa cidade e por ela muito trabalhou.
Ele era muito dinâmico, inteligente, muito evoluído e naquele tempo (anos 20) construiu lá uma grande piscina. Era a única em toda a redondeza da cidade e uma grande novidade que os jovens montes-clarenses aproveitavam. Toda a extensão - onde hoje estão localizados os bairros Melo, São Luiz e Ibituruna - pertencia à sua fazenda. Muitos anos antes pertencera ao meu avô Domingos Garcia Tupinambá que, vindo da Bahia, aqui se estabeleceu com uma fazenda e grandes negócios. Com sua morte, a mesma foi passando para outros proprietários, até chegar ao Dr. Santos.
Quando menina, na época do meu avô (era muito criança), tenho poucas lembranças daquele lugar mas na minha juventude eu me lembro de tudo.Com saudade.
Frequentei muito aquele pé de serra.
Naquela época a nossa cidade era muito pequena, pouca distração, de sorte que a nossa maior alegria era o passeio na piscina do Dr. Santos.
Saia todas as manhãs com as companheiras: Yeda e Yolanda Maurício, Ydoleta Maciel, Mary e Zuleika Bessone, Alaide Amorim, Natália Peixoto, Luíza Guerra, Yris Sarmento, Helena de Paula, Lia Prates e as minhas irmãs Fely e Maria que, embora mais velhas, sempre nos acompanhavam.
Íamos a pé pela Av. cel. Prates até a Santa Casa e, por incrível que pareça, aí terminava a cidade. Daí pra frente seguíamos dentro do mato por uma estrada estreita e poeirenta. Mas íamos felizes pois na juventude não se conhece tristeza e estávamos naquela fase de ilusões, sonhos e esperanças.
Apostávamos que naquelas idas à piscina os exercícios e a natação nos dariam belas formas, fazendo desaparecer a barriguinha e alguma gordurinha indiscreta que tanto nos preocupavam.
Mas não há bem que sempre dure.
A piscina não era como as de hoje, tratada e com muito luxo. A água entrava e saia naturalmente (vinha de algum riacho ou córrego) e era aproveitada para molhar o pomar e a horta.
O Dr. Santos, médico estudioso, descobriu que a piscina era um foco de Xistosomose.
Com grande tristeza interrompemos nosso passeio matutino: a nossa “Academia” estava condenada.
Até hoje eu me lembro, com saudade, daqueles serras e da fazenda tão bonita que desapareceu transformada hoje nos luxuosos Bairros: Melo, São Luiz e Ibituruna. Que Deus tome conta das nossas serras, conservando-as para o embelezamento da nossa cidade.

(N. da Redação: Ruth Tupinambá Graça, de 94 anos, é atualmente a mais importante memorialista de M. Claros. Nasceu aqui, viveu aqui, e conta as histórias da cidade com uma leveza que a distingue de todos, ao mesmo tempo em que é reconhecida pelo rigor e pela qualidade da sua memória. Mantém-se extraordinariamente ativa, viajando por toda parte, cuidando de filhos, netos e bisnetos, sem descuidar dos escritos que invariavelmente contemplam a sua cidade de criança, um burgo de não mais que 3 mil habitantes, no início do século passado. É merecidamente reverenciada por muitos como a Cora Coralina de Montes Claros, pelo alto, limpo e espontâneo lirismo de suas narrativas).

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