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Mensagem: CONVERSA DE TREM DE FERRO (Para Alberto Sena e quem mais gosta de trem) Com muita saudade e não menos prazer, recordo alguns primeiros e alegres anos de minha vida, tentando, talvez,” a bem das gerações contemporâneas que precisam conhecer nosso passado (como diz P.Narciso)”, ir bem fundo nas minhas lembranças. Da mais tenra infância, acredito, embora muita coisa já nos fuja. Também meio século se passou. Ufa. Nós íamos a pé pra estação - distância de apenas alguns quarteirões - a família toda, sempre acrescida de uma ou mais tias solteiras ( Vivi, Tetê e Stela) sempre presentes nestas viagens para B.Horizonte, fazendo companhia e ajudando minha mãe a tomar conta da gente. O que não era fácil, diga-se. Embora, que nem James Bond (talvez um pouco menos), elas também tinham licença para matar, ou melhor, beliscar. Suaves beliscões, nem tanto. A gente, então, as respeitava, mas...os braços viviam roxos. Rrs. Quanto tinha muita bagagem, mandava-se um recado pra Seu Matias Peixoto – ali na rua Mangabeira, pertinho da casa de minha avó na Afonso Pena-, carregador de malas oficial da Rede (pai de Tu, Vicente Pezão e José Matias, meus amigos, craques inesquecíveis do futebol montes-clarense) e ele passava lá, na hora certa, com sua garbosa e lustrada charrete de pneus de sedam. Sério, no alto de seus cabelos brancos, sempre, carinhosamente, nos convidava pra sentar junto dele na boleia. E a aventura começava a partir dali, no trote do cavalo (ou burro, não me lembro) pelas ruas de terra da velha Montes Claros. Para nós era como se fosse uma verdadeira carruagem do tempo dos príncipes e contos de fadas. A linda e antiga estação era uma festa. Passageiros, maquinistas, chefe de trem, lá todos se conheciam. As partidas de trem sempre eram um grande acontecimento. Os pais conversando e fumando alegremente no saguão e plataforma (naquele tempo o cigarro incomodava menos gente), os meninos correndo e dando canseira às mães e tias; o indefectível cheiro de carvão pairando no ar , vindo da fumegante locomotiva a vapor à frente do comboio, fora da plataforma de embarque. A gente não se continha e descia até os trilhos para vê-la de perto. E lá estava ela, a famosa Maria-Fumaça, na sua mais completa e lendária magnificência, parada e ligada, soltando altos e alternados suspiros de fumaça branca, ao exato tempo / momento que o suado e esforçado foguista jogava-lhe, contínua e lentamente, sucessivas pás de carvão dentro da fornalha . Esta alternância, com o som chiando no vácuo, provocava-nos o maior susto e, ao mesmo tempo, nos maravilhava de encantamento. Logo, logo, chegavam as tias, grudando nosso braço para voltarmos à segurança da plataforma. E tome beliscão. Quando o trem partia, devagar, não saíamos da janela, cabeça pra fora, apesar de mil alertas do perigo das faíscas ocasionais. Os avisos não faziam muito efeito: só sentávamos após a última casa ter -se transformado de vez numa minúscula casinha de presépio, desaparecendo no já distante e belo horizonte montes-clarense. Sentados nas poltronas, uns em frente aos outros, abria-se a primeira panela, bem vedada num caseiro e branco pano de prato, contendo uma senhora farofa de galinha, pedaçuda e bem temperada( de lamber os beiços) feita por minha vó, Finita: as tias e minha mãe comiam de” capitão”, os bolinhos enrolados na mão com invejável perícia. A meninada comia de colher mesmo. Nunca aprendemos a enrolar aqueles bolinhos na mão, sem deixar a farofa cair toda no chão. As cidades se seguiam, dolentemente: Bocaiuva, Granjas, Dolabela e Augusto de Lima, onde o trem parava e eram apresentadas aos passageiros as mais variadas e gostosas mangas do mundo. Rosa, comum, ubá, espada, pela janela os meninos juntos aos trilhos ofereciam e vendiam um saco delas, inteirinho, a troco de uns poucos mil réis. Era manga para estufar a barriga de muito glutão durante toda a viagem e ainda sobrava para levar pra casa. Sob o olhar complacente do Chefe de Trem, comíamos e nos lambuzávamos daquelas delícias, atirando as cascas e caroços pela janela. Hoje em dia, talvez os mais afoitos e críticos nos achassem pouco ecológicos, mas já sabíamos que um outro ser qualquer, passarinhos ou até mesmo um gambá, iria se fartar à larga de nossas sobras... Corinto, Curvelo e Sete Lagoas. Estávamos quase chegando. Mais algumas horinhas e... Belo Horizonte. Aí um velho bonde nos levava a até a rua do Ouro 317, Serra, esquina de Aguapeí. Abraços a todos. Flavio Pinto
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