Este espaço é para você aprimorar a notícia, completando-a.
Clique aqui para exibir os comentários
Os dados aqui preenchidos serão exibidos. Todos os campos são obrigatórios
Mensagem: QUANDO DEZEMBRO BATE À PORTA José Prates Fujo de escrever sobre coisas de um tempo passado, muito distante. Relembrar, revivendo intimamente aqueles momentos, sozinho no secreto da mente, sempre acontece. Escrever, publicar é diferente, É distribuir as lembranças, chamando alguém para revivê-las em nossa campainha e ninguém sabe se esses momentos e fatos foram agradáveis a todos que os viveram e devem ser por eles, relembrados. Além do mais, hoje, pessoas na minha idade são poucas, principalmente os que viveram comigo os momentos de uma infância feliz, num passado distante na tranqüilidade de uma cidadezinha como Jacaraci no sertão baiano, sem as atribulações que, hoje, nos atingem a todos. Quem resta, não sei quantos, alguns devem estar recolhidos aos lares no aconchego das famílias, com netos e bisnetos, vivendo um hoje de satisfações, esperando com tranqüilidade o chamado para irem embora; outros como eu, e mais uns poucos, estão envolvidos com o trabalho produtivo, pressionados pelas responsabilidades que assumem no desempenho da função, não têm folga para recordações de um tempo passado, por mais feliz que tenha sido. Mas... Dezembro está batendo à porta. E quando dezembro chega vêm com ele as lembranças mais fortes e é impossível afastá-las de nós. As férias de fim de ano chegavam e as escolas fechavam, soltando a criançada para suas brincadeiras, deixando que dormissem até mais tarde. As professoras viajavam de regresso à casa dos pais, geralmente Salvador que chamávamos de Bahia. Professora filha da terra era só Dona Julieta, casada com o Prefeito, mãe de Yeda e Julizart. Nas outras cidades sertanejas baianas ou mineiras, as professoras vinham de longe. Nesses sertões pobres e esquecidos, nenhuma mestra era filha da terra, exceto em Montes Claros que já tinha Escola Normal. Vinham de outras plagas, a maioria solteiras que, rapidamente encontravam pretendentes. Quanta recordação tenho dessas férias, metade do tempo passado na fazenda de Tio Eloi. Era a época da moagem e eu ficava sempre à beira do engenho, tomando caldo de cana e comendo “puxa”, a rapadura ainda em preparo. Quanta alegria correndo pelo mato ralo buscando araçá ou subindo no umbuzeiro pra tirar o fruto. Encantava-me a perfeição do ninho da rolinha feito no galho do umbuzeiro, com os filhotes de bico aberto, esperando a mãe com o alimento. No capinzal do pasto, a boiada se alimentando, as “vacas paridas” cuidando de seus filhotes que a elas se agarravam buscando proteção. O gavião solitário planava no ar, à procura da presa. Eu sabia ler e escrever, novidade naquele mundo. Às vezes, a pedido dos agregados e vizinhos da fazenda, eu passava o dia respondendo a cartas que vinham de São Paulo enviadas aos que ficaram, pelos que foram em busca de trabalho. Eu me lembro que todas as missivas começavam dizendo: “por estas mal traçadas linhas” e sempre terminavam com a frase que ficou rotineira: “desculpe os erros e a letra”. Não é possível esquecer os “reisados” com suas gaitas e seus bombos, nem as “pastorinhas” com seu traje azul, levando lanternas e cantando hinos natalinos, indo de casa em casa em visita aos presépios. Em cada casa era uma festa com comes e bebes oferecido aos reiseiros e pastorinhas. A meninada ia atrás procurando tomar parte nas guloseimas que a casavisitada oferecia. Dia 6 de janeiro encerrava o reisado e era grande a festa de encerramento. A “Missa do Galo”, na véspera de Natal, celebrada na Matriz à meia noite, era o que eu esperava com ansiedade. Não dormia, esperando a minha avó aprontar-me para irmos para Igreja que naquela altura, já estava cheia de povo vindo dos arrabaldes, a maioria mulheres de saias rodadas e xales coloridos cobrindo a cabeça. O Padre Mario, holandês de nascimento e jacaraciense de coração, estava na paróquia há muitos anos, conhecia todo mundo, muitos que ele próprio batizou e casou. Na celebração, com a Igreja repleta, o Padre emprestava ao ato um caráter festivo, com o “coro” composto de moças da sociedade, iniciando a celebração com o hino sacro “Feliz Natal” que enchia a todos de emoção. Depois da missa, vinha a pequena ceia e em seguida a cama, na espera do Papai Noel que para muitos, não chegava. (José Prates, 84 anos, é jornalista e Oficial da Marinha Mercante. Como tal percorreu os cinco continentes em 20 anos embarcado. Residiu em Montes Claros, de 1945 a 1958, quando foi removido para o Rio de Janeiro, onde reside com a familia. É funcionário ativo da Vale do Rio Doce, estando atualmente cedido ao Sindicato dos Oficiais da Marinha Mercante, onde é um dos diretores)
Trocar letrasDigite as letras que aparecem na imagem acima