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montesclaros.com - Ano 25 - segunda-feira, 25 de novembro de 2024
 

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Mensagem: A morte de um rio - Luiz Ribeiro - Era segunda metade da década de 1970. Ainda criança, eu morava numa fazenda, no município de Francisco Sá. A casa dos meus pais ficava a 300 metros do Rio Caititu, a maior riqueza da região. A seca do Norte de Minas – como é histórica - naquela época já existia. Mas, graças à presença do rio, os efeitos da estiagem nem eram sentidos. Afluente do Rio Verde Grande, o Caititu corria caudaloso o ano inteiro. Nos períodos da estiagem severa (maio a setembro), as partes baixas próximas do rio eram tomadas pelas plantações de alho. E não precisava nem o uso de algum equipamento de irrigação. A oferta de água era tanta que bastava apenas um pequeno açude –sem comprometer a vazão – que a água corria para os canteiros, por gravidade – “água de rêgo”, como se falava por ali. No período chuvoso (“nas águas”), a pujança do rio se tornava mais visível, os terrenos próximos de suas margens viraram brejos e o plantio de alho dava lugar aos arrozais. As enchentes aconteciam, mas sem assustar ninguém. Para os mais jovens, era oferecido o ofício “olhar arroz” – que consistia em espantar os pássaros que atacavam a plantação - mas que acabava permitindo alguma diversão. O trabalho consistia em afastar as aves com o “xô” ou “pelotas” (feitas de barro) disparadas por um “bodoque”, instrumento feito de madeira e cordão, em formato de arco, herdado dos tempos primitivos. A fartura de água também possibilitava o funcionamento de engenhos dos pequenos produtores ao longo das margens do rio. A ´moagem´ ia de maio a setembro, na época da seca, para produzir rapadura ou cachaça (em meno escala). Alguns proprietários ainda mantinham engenhos feitos com imensos troncos de árvores, movidos pela força de uma dupla de bois carreiros, como nos tempos antigos. Além de garantir a produção agrícola e fornecer água limpa para os moradores das fazendas e sítios cortados por ele, o Caititu também atraía gente da cidade. Quase toda semana apareciam visitantes, oriundos de Francisco Sá e Montes Claros para pescar algum piau, bagre e traíra - esta espécie procurada nos poços mais fundos. A pesca se limitava ao anzol, sem qualquer ameaça à preservação dos cardumes. Mas, o maior prazer que o rio proporcionava mesmo era o banho em suas águas. Recordo-me das inúmeras vezes em que, juntamente com outros amigos de infância, saltei no rio para nadar, mergulhar, brincar, enfim, fazer tudo o que criança gosta de fazer dentro da água. Lembro ainda de uma pequena lagoa junto a uma ´manga´ de bengo, que sempre enchia de peixes após cada enchente. O tempo passou. Agosto de 2011. Retornei ao Caititu, no mesmo local onde curti os bons momentos da infância. A minha decepção foi total. Não existe mais aquele rio caudaloso que tinha tanta água a ponto de irrigar plantações de alho “por gravidade”. Aliás, as hortas também desapareceram, dando lugar ao pasto. Há vários anos que o Caititu virou um rio intermitente, se limitando a existir praticamente no período chuvoso. Segundo um morador da região, desde abril que ele começou a “cortar”e, com o sol forte, a água foi diminuindo até secar de vez. Por que o rio morreu? Um proprietário da região diz que houve um desvio da água perto de sua nascente. Mas, ninguém sabe ao certo o motivo da destruição, pois há outras versões para o fenômeno como o desmatamento e a retirada das matas ciliares. A mudança do cenário foi tão marcante que se ficaria até difícil de acreditar nela se eu não visse com os meus próprios olhos e sentisse com meus próprios pés, ao caminhar dentro do leito vazio e estorricado. Voltei ao ponto onde, no barranco, fica uma grande gameleira cujos galhos serviam de trampolim para as crianças e adultos saltarem no poço que existia no lugar. Mesmo fragilizada - já que necessita de água constante, a gameleira resiste ao tempo. Talvez, para ajudar na memória de quem já conheceu o Caititu no passado e provar que o lugar onde o rio corria é aquele mesmo.

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