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montesclaros.com - Ano 25 - sexta-feira, 17 de maio de 2024
 

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Mensagem: BRINCADEIRA DE CRIANÇA Alberto Sena Foi uma sensação estranha, como se de repente o movimento de rotação da Terra tivesse invertido e por alguns instantes tornara possível retroagir no tempo, década de 50, quando se era criança, em Montes Claros. Tudo porque hoje cedo meninos brincavam de esconde-esconde debaixo da nossa janela. Particularmente, fiquei surpreso ao me deparar com a cena. E mais surpreendido, ainda, fiquei com a possibilidade de testemunhar “in loco” crianças alegres repetindo brincadeira nem tão antiga. Em qualquer outro lugar seria hoje cena considerada atípica. Mas, naquela década, não porque inexistiam “atrativos” tantos a desviarem a atenção das crianças como há hoje. Todavia, aqui, isso é normal – ainda bem – porque se trata de uma cidade “sui-generis” a partir da sua localização, na linha divisória entre o Norte de Minas e o Vale do Jequitinhonha. Onde já se viu um acontecimento deste nos dias atuais, quando as crianças nascem com celular na orelha como se fosse brinco e logo nos primeiros anos de vida operam computador e possuem e-mail, twiter, i-pod etc., sem nunca ouvir “não pode” porque senão pode traumatizá-las psicologicamente? Vi quando um dos meninos apoiou o braço direito na parede e nele encostou a testa para começar a contagem antes de sair correndo: “Um, dois, três...” Este momento me recordou de como fazíamos a mesma coisa, “um, dois, três (...) e 31 de janeiro, quem eu pegar primeiro”. E então saía a procura dos amigos, aquele encontrado ia para o “pique” e tudo se repetia na alegria pueril. As crianças vistas hoje cedo felizes a brincar não tinham celular escondido no bolso. Aliás, nem bolso elas tinham. Usavam calções. E pude, então, recordar de como é gostoso brincar. E do quanto brinquei. As crianças precisam brincar. Os adultos criativos de amanhã dependem das brincadeiras brincadas na infância. As crianças, hoje em dia, brincam de maneiras totalmente diferentes. Elas não saem do lugar. Sentadas diante do computador, utilizam-se de jogos e vídeos nem sempre com mensagens positivas, e isso é um convite à reflexão sobre o que será dessa geração de crianças quando a fase de adulto chegar. Ao ouvir a voz de um menino, este certamente escondido, conversando com o outro distante, naturalmente o pegador, foi como se em um átimo na tela da memória passasse o filme Amacord, de Frederico Fellini. A voz de um deles era disparada bem debaixo da nossa janela e a do outro vinha de longe como se escapasse do inconsciente. “Lá vou eu”, disse o primeiro. E ele foi. Procurou ali, lá e acolá e não encontrou ninguém para pegar. Foi semelhante ao ocorrido comigo quando busquei um lugar onde esconder para não ser encontrado me postando de cócoras sobre o eixo de um caminhão estacionado porque enguiçado. Ficava entre a carroçaria e o eixo. Quem só espiava debaixo do caminhão não via nada. Um dado da maior importância: escondido onde estava tinha a visão total do ambiente. Dava para ver por entre as frestas da carroçaria o “pique”, um poste de cimento. Na primeira vez, eles tão intrigados ficaram com o meu sumiço, pensaram na hipótese de eu ter desistido da brincadeira. Todos os meus companheiros já haviam sido “presos”. Estavam enfileirados no poste, aguardavam-me para “libertá-los”. No momento propício, esguerei por debaixo do caminhão e pisando leve para não chamar a atenção surpreendi os “guardas” e libertei todos os companheiros. Para alegria geral. “Fugimos” em desabalada carreira. Todos queriam saber aonde eu me escondia. Consegui guardar o esconderijo em segredo por algum tempo, mas sob livre e espontânea pressão apontei o lugar. Os meninos ficaram com cara de tacho, encabulados. Eles nem imaginavam o quanto de riso segurei para não denunciar o esconderijo, enquanto me procuravam. Conseguia ver a todos e ninguém me via, embora passassem perto e espiassem debaixo do caminhão. Trazido de volta a realidade atual pela risada de uma das crianças ao descobrir o esconderijo da outra, pude avaliar, décadas depois, o quanto é importante a relação telúrica para a saúde mental dos pequenos. Mas havia grande diferença destes em comparação com os da década de 50. Os meninos vistos hoje cedo corriam calçados de tênis, enquanto aqueles pisavam descalço o chão empoeirado (ou enlameado) de então. Mas, o êxtase era o mesmo.

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