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Mensagem: Mi-carême dos anos 26Ruth Tupinambá GraçaFoi numa noite de Mi-carême num sábado da Aleluia.O antigo Cine Montes Claros’, apenas um galpão enorme, sem forro, de piso cimentado.Naquela noite, entretanto, ele estava bonito na sua estrutura grotesca, ornamentado com máscaras de Pierrôs e Colombinas, serpentinas multicores, que lhe davam um aspecto alegre e festivo. A fina flor da sociedade montes-clarense se divertia ao som alegre e contagioso das músicas carnavalescas.O lança-perfume, que ainda não fora proibido, tomava o ambiente excitante e com cheiro de pecado... e até mesmo o jovem delegado; Dr. Marcelo Burlamarque, muito educado e bonitão, (recém-chegado de Belo Horizonte) e que já conquistara a simpatia da cidade e os corações das sertanejas, se esquecera, um pouco, a severidade da sua profissão e também puxava o cordão ..Lá pela madrugada, quando os galos anunciavam o alvorecer, a festa acabou.Os foliões saíam apressadamente, aglomerando-se impacientes na calçada.Inesperadamente, para espanto de todos, surge, montado num cavalo fogoso um ´vaqueiro´ com roupas e chapéu de couro, o rosto oculto por uma tinta preta; parecia realmente um negro retinto.O cavalo empinou, levantando as patas dianteiras, como se fosse saltar, e o cavaleiro disparou o revolver à queima-roupa, em cima das pessoas que saíam da festa.Foi terrível e assustador. Naquela hora trágica, estabeleceu-se o pânico entre os presentes, enquanto uma segunda descarga provocava correrias inconscientes, pelas ruas adjacentes, numa confusão justificável.Aproveitando tumulto o criminoso fugiu, em disparada, sem que a polícia lhe pusesse as mãos, escapando assim do flagrante e da prisão.Mas todos o reconheceram, apesar do disfarce. Era Chico Dominguinhos, protegido pelos coronéis daquela época, e infelizmente um montes-clarense da nossa sociedade, mau caráter, conhecido de todos, célebre pela valentia, arruaças noturnas e desordens na cidade.Era o valentão que intimidava e batia nas prostitutas; nos cabarés, humilhava e zombava dos mais fracos.Tinha as “costas quentes”, acobertado pelos coronéis, recompensa pelos serviços prestados como pistoleiro.Infelizmente nossa cidade era, naquela época dominada pelo coronelismo, que usava e abusava do prestígio político, cometendo, muitas vezes, grandes injustiças e muitas perseguições.Mas aquele vaqueiro disfarçado queria acertar numa só pessoa e o conseguiu.Cessado o tiroteio, na rua semideserta, verifico-se que havia um corpo na calçada. Era do jovem delegado atingido no peito, envolto em uma onda de sangue.´Por uma pequena rixa, o célebre bandido tirou a vida do delegado, que, na sua ingenuidade, sonhou por ordem e justiça na nossa cidade. Era honesto e corajoso. Seu pecado foi desacatar os ´mandatos´ dos coronéis.Dias antes, durante uma busca noturna na periferia da cidade, ele desarmou o ´pistoleiro´ assassino, proibindo, de modo geral, o uso de armas sem porte.Fato simples e natural numa cidade civilizada. Isto fora o bastante para enfurecer o “valentão”, {que se sentiu ofendido} jurando matá-lo, e o fez naquela noite trágica do Mi-carême.Foi um final infeliz para a carreira promissora do jovem bacharel, que chegara a Montes Claros, cheio de esperanças, e uma nódoa feia, que durante muitos anos, manchou o nome da nossa cidade.O criminoso ficou foragido durante algum tempo. Anos depois, voltou e andava tranqüilamente pelas ruas.Deve ter sido julgado simbolicamente, saindo livre, num `júri muito especial´.
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