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montesclaros.com - Ano 25 - segunda-feira, 25 de novembro de 2024
 

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Mensagem: Pharmácia com PH

A Farmácia de seu Mário Velloso, na rua Camilo Prates esquina de Padre Augusto assegurava à população de Montes Claros, na primeira metade do século passado, um espaço onde a saúde da família montes-clarense tinha a garantia de competência e segurança na manipulação de remédios.
Nas portas que se abriam para a rua Camilo Prates, duas figuras recebiam os fregueses: um homem em tamanho natural, cabeça coberta por um chapéu carregando um enorme peixe nas costas, me abalava. Era a propaganda da emulsão de Scott. Aquele gosto intragável, detestável, era o supra-sumo do sofrimento das crianças. Para compensar, na outra porta, a figura de uma linda e saudável moça fazia propaganda do sal de frutas ENO, carregando nos braços um cesto com uvas roxas e rosadas. Eu achava que eles eram namorados e como ela agüentava aquele cheiro...
Um balcão torneado em madeira de lei, verdadeira obra de arte, separava o farmacêutico dos clientes. Prateleiras altas protegidas por tampos de vidros, exibiam potes, anfôras em cores variadas. Ampolas, pastilhas, pomadas e ungüentos preenchiam as prateleiras.
Lembro-me de nomes de remédios, fortificantes, xaropes, pílulas: Água Inglesa, xaropes famel – delicioso – Bromil, Maravilha Curativa. Havia um lombrigueiro que, de tão pavoroso, bloqueei o nome. Os calmantes Água de Flor de Laranjeira, Água de Melissa eram remédios para os nervos, para melancolia. Deviam ser os tranqüilizantes e antidepressivos daqueles tempos.
A fantasia tomava conta da minha cabeça quando via senhoras e moças comprando os remédios “A Saúde da Mulher” e “Regulador Xavier n° 1 excesso, n° 2 escassez”, porque elas abaixavam o tom de voz, coravam as faces e não encaravam o vendedor. Tempos depois, decifrei o segredo...
Separando o local das vendas, uma porta móvel levava ao laboratório. Naquele local a química e a alquimia se entrelaçavam. Usando um jaleco de linho branco, seu Mário Velloso atrás do balcão, homem paciente, bondoso, voz pausada aviava as receitas, escutava as queixas físicas e psíquicas de seus clientes e amenizava suas angústias.
Esses detalhes afloraram porque criança nunca esquece das coisas boas, queridas, que um dia fizeram sua infância. Essa minha intimidade com a farmácia de seu Mário Velloso é que sempre eu ia lá vender os vidros de remédios vazios por um tostão a unidade. Lavavá-os com água, sabão e caroços de feijão. A féria era guardada no cofre de barro que comprava no Mercado Municipal ou era usada para comprar picolé no Minas Bar. Sempre entregava os vidros no laboratório e lá para mim era um espaço misterioso com seus cheiros e nomes colados em gavetas: Calomelano, Salofeno, Violeta Genciana, Sal de Glauber, Ruibarbo, Jalapa, etc... Balanças com pesos infinitamente pequenos, almofariz de louça para triturar substâncias, pipetas, decantadores, “gral” para medir porcentagens, uma parafernália de objetos. Também no laboratório, o auxiliar da farmácia colava rótulos, prensava cápsulas, fazia curativos, aplicava injeções.
Nas tarde de Sábado, o pessoal da zona rural vinha fazer consultas e comprar remédios. Amarravam os cavalos e em voz baixa contavam suas mazelas, as de suas esposas e filhos. Seu Mário recebia-os com a maior atenção e toda paciência do mundo, traduzindo o que diziam e medicando-os adequadamente.
No final da tarde, princípio da noite, era a vez da farmácia se transformar num clube inglês. Só cavalheiros, rodas de amigos se formavam. Discutiam de um tudo. Viravam a cidade pelo avesso: política, notícias lidas no “Correio da Manhâ” e no “Estado de Minas”, quem nasceu, quem morreu, quem casou; quem viajou nos trens da Central do Brasil para a Capital, quais as “damas da noite” que chegaram para animar os Cabarés da cidade...
Escrevo para não esquecer a memória do mundo e da cidade dos Montes Claros. E é com imensa saudade e carinho que homenageio seu Mário Velloso e todos os montes-clarenses que entraram de mansinho em nossas vidas e delas não saíram nunca mais.

Carmen Netto Victória

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