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montesclaros.com - Ano 25 - segunda-feira, 25 de novembro de 2024
 

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Mensagem: VIOLÊNCIA - CAUSA E EFEITO

José PRATES

´Rapaz de 23 anos foi morto com meia-dúzia de tiros na porta de casa; é o quarto assassinato em pouco mais de 24 horas´. Foi o que o jornal publicou quase no canto da página, sem alarde, como noticia rotineira. Assim falando, parece que se refere a um jornal do Rio de Janeiro ou de São Paulo, porque a linguagem é a mesma, e é o mesmo o jeito de noticiar: frio, sem emoção; tudo igual, sem tirar nem por, até mesmo ninguém ser preso. Parece em tudo; mas, nem o jornal nem a notícia são do Rio ou de São Paulo. São de Montes Claros, norte de Minas, alto sertão! Pra dizer a verdade, Monsclaros, como eles falam, é uma cidade grande com ares de metrópole, perdendo o jeito de sertão; um povo pacato que vive do trabalho. Pelo menos, era assim até há pouco. Então, o que aconteceu pra frieza na notícia, sem mostrar espanto do povo pacato que quase nunca via defunto estirado no meio da rua, crivado de balas? Ainda mais assim, crivado de balas, que não é coisa de sertanejo. É coisa de gente de fora, pode crer! Agora, falando sério: a insensibilidade à violência, causada pela constância de fatos violentos que virou moda nos grandes centros, chegou até lá, levada como enxurrada pelos meios de comunicação, em noticiários frios como se tudo fosse rotina em tudo quanto é lugar do país. Virou moda ser insensível à criminalidade que graça. E se for moda, todo mundo acompanha, e acha bonito. Diz que é o progresso que chegou, igualzinho quando houve o primeiro assalto a banco, logo depois da revolução de 63. Todo mundo gritou: ´meu Deus! o Brasil progrediu, já tem até assalto a banco´ Hoje é comum; virou moda, moda que veio de longe, jogou todos no mesmo saco: igualou tudo. Por que isto? Perguntamos a nós mesmos, por falta de interlocutor. Responder o que? Olhe pra trás, até perder de vista e talvez encontre a resposta. Governos e mais governos que não pensaram no amanhã, não imaginavam que um dia viesse uma tal de tecnologia que fosse avançando e mudando tudo, deixando pra trás as coisas velhas e jogando fora o homem despreparado. Naquelas bandas do sertão vieram os arados mecânicos, arando e adubando, e a colhedeira computadorizada que colhe, debulha e ensaca, substituindo a foice e a enxada e o arado braçal. Nunca esses governantes do passado preocuparam-se em preparar o homem para viver esse amanhã. Se algum previdente lhes alertasse, com certeza, iriam dizer com a fleugma do bom mineiro, que ´esse trem nunca vai existir´. Mas, o ´trem´ está ai pedindo que lhe operem e cadê o operador? Não pensaram em prepará-lo. Fora esse, outros ´trens´ chegaram trazidos pela tecnologia que avança como monstro destruidor dos ´trens´ antigos. E cada vez mais precisando de alguém preparado. Cadê esse alguém? Pergunte aos governos de tempos passados e nem eles sabem responder. E por falar em trem, trem mesmo, o trem de carga, pra onde foi? Acabou, ué. Só ficaram os trilhos cobertos de mato. A imprevidência, o desinteresse ou o interesse sabe lá, dos governantes deixou que as carretas, cada vez mais pesadas, e mais modernas, passassem por cima do velho trem ronceiro e despreparado. O bonde, da mesma família do trem, foi diferente: meteu-se terra adentro, virou ´metrô´ e est´aí todo moderno, correndo debaixo do chão. Pois é, até o bonde preparou-se para o amanhã. E o nosso homem? Não acreditou em milagre e não se preparou. Hoje é vida de competição, sem preparo não há emprego; sem emprego não há condições de sobrevivência, a menos que tenha nascido rico ou ter-se tornado rico, sei lá como. Mas, isto de ficar rico de qualquer maneira, agora está difícil, porque a PF acordou do longo sono. Sem meios de sobrevivência, fazer o que? ´Correr atrás´, como diz o carioca. É ai que aparece a violência, como efeito disso tudo. O que fazer agora? O enfrentamento do problema que passa por vários níveis de atuação, devia ter tido início há muito tempo, ao nascer do processo de organização do crime. E o que fizeram? Nada. Na sua comodidade, pensaram como o mineiro: ´esse trem não vai chegar´, mas chegou e está ai desafiando todo mundo. Edin Sued, do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião da PUC-SP, diz que a sociedade deve pressionar seus dirigentes, para que sejam implementadas medidas referentes à segurança pública e políticas que melhorando a qualidade de vida das populações menos assistidas ajudem a cortar a violência em suas raízes. Todo mundo sabe disso. Mas, alguém fez? Ao contrário, abandonou o homem despreparado à sua própria sorte,nesse mundo cruel, deixando que ele encontrasse seu próprio caminho. Sem saber fazer nada, ele procurou, então, o caminho mais fácil: a violência como meio de sobrevivência. Foi por sua culpa, por seu desejo? Acho que não. A sociedade é que não se organizou para receber a todos na condição em que se encontravam. Esse homem devia ter sido integrado a essa sociedade com a qual se partilha o sentido da existência e da luta pela vida. Isto aconteceu? Não. E para piorar, o ensino público destinado a preparar o homem para o mercado de trabalho não existiu. Nada havia além de uma ou outra escola técnica ali ou acolá. E onde estava a sociedade? Fechada dentro de seus próprios interesses, em vez de assumir o gerenciamento da cidadania, organizando-se de baixo para cima, como disse Nicolau Sevcenko. Caminhando por linhas próximas, a Doutrina Social da Igreja sempre valorizou a ação integrada e o protagonismo de todas as instituições sociais - família, escola, sindicato, etc. Uma sociedade consegue resolver seus problemas - inclusive o da violência - quando essas instituições se articulam e assumem seu papel na vida pública. É dever do Estado? É. Mas, não basta pressiona-lo para que as coisas aconteçam. É necessário, antes de tudo, que todas as organizações sociais trabalhem em conjunto e sejam apoiadas pelo Estado dando condições para que as pessoas, principalmente os menos afortunados, vivam como protagonistas de suas vidas, integrando-se a essa sociedade para torná-la mais capaz de enfrentar a violência.
E-mail: [email protected]
Telefone: (21) 27911576

(Nota da Redação: a notícia ´fria´ citada neste artigo é deste noticiário eletrônico. Temos a preocupação de publicar as notas de natureza policial, especialmente as de homicídio, de maneira sóbria, retirando-lhes qualquer traço de exploração sensacionalista. É o registro sucinto que fazemos, sem mutilar os fatos, para não alarmar ainda mais os que já vivem alarmados, ressentido-se da insegurança generalizada. Esperamos o tempo em que não mais será necessário fazer o registro de crimes e de atos de violência e selvageria).

(José Prates é jornalista e Oficial da Marinha Mercante. Como tal, percorreu os cinco continentes em 20 anos embarcado. Residiu em Montes Claros, de 1945 a 1958, quando foi removido para o Rio de Janeiro, onde reside com a família. É funcionário ativo da Vale do Rio Doce, estando atualmente adido ao Sindicato dos Oficiais da Marinha Mercante, onde é um dos diretores)

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