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montesclaros.com - Ano 25 - domingo, 24 de novembro de 2024
 

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Mensagem: Presente de grego

Waldyr Senna Batista

As declarações em contrário não conseguiram dissipar o temor generalizado de que se repetirão as transferências de criminosos de alta periculosidade, de outras regiões para o presídio de Montes Claros. O juiz Isaias Caldeira Veloso, da vara de execuções penais, assegura que só consentiu na vinda de mais 99 presos sob a condição de que esta seja a última vez. “Não aceitarei mais que nenhum preso de outra região seja transferido para o presídio desta cidade”, disse.
Contudo, aconselhável que a clara disposição do magistrado fosse reforçada pelo prefeito Athos Avelino que, afinal, é o grande responsável pela construção do presídio. Sob seu comando a prefeitura fez a doação do terreno e ele convenceu os moradores do bairro Village do Lago a aceitar o empreendimento, argumentando que a nova cadeia seria fator de desenvolvimento naquela parte da cidade. Os moradores cederam e o prefeito até relacionou a obra, viabilizada com recursos do governo estadual, entre as que, sob o mesmo sistema de “parceria”, estão sendo executadas na cidade.
Ultimamente, esse item foi discretamente suprimido das peças publicitárias da administração, provavelmente porque o chefe do executivo percebeu a inconveniência do seu registro na delicada fase de conquista de votos pela reeleição. Trata-se de autêntico presente de grego, ainda que empacotado como solução para o eterno problema da cadeia que historicamente tanto intranqüiliza a população. Mas, nesse momento crucial, em que se configura conflito no uso do presídio, o prefeito tinha o dever de se pronunciar, condenando a transferência dos presos, ao menos como respaldo à posição do juiz, e dizer ao governo estadual que também repudia esse tipo de procedimento. Ao autorizar a vinda dos presos, o juiz ao menos foi sincero ao se mostrar consciente dos efeitos negativos da medida, confessando que “autorizei porque entendo os esforços da Secretaria de defesa social em humanizar e melhorar o sistema carcerário”. O prefeito manteve-se calado.
Esse silêncio poderia ser tomado como admissão de conhecimento prévio do perfil do presídio. A própria denominação do presídio leva a essa presunção. Para efeito da burocracia, ele é identificado como “Centro de remanejamento de segurança prisional”. Remanejar significa trocar, mudar de um local para outro, e é o que têm feito as autoridades do sistema de segurança pública. Dava para desconfiar desde o momento em que foi expedida a ordem de execução da obra...
As inconveniências oriundas da instalação de um presídio com capacidade para 660 presos são notórias. Várias cidades queixam-se amargamente, entre elas Santa Luzia, Ribeirão das Neves e Contagem, as três nas proximidades da capital, que acolhem os mais perigosos bandidos do Estado. No entorno dos presídios surgem, fatalmente, comunidades identificadas com o crime, constituídas por familiares dos presos e comparsas deles. Em razão disso, em vez de reduzir os índices de crimes nas cidades, esses presídios fizeram foi incrementá-los, até porque do interior deles é que são comandados os grupos mais perigosos que agem do lado de fora.
Inaugurado há poucos meses, o presídio de Montes Claros já abriga 470 presos, estando próximo da saturação, e se não houver reação de repúdio por parte das autoridades locais, poderá chegar à superlotação, que é a característica de todos esses estabelecimentos no país inteiro. O “cadeião” da BR 135, a famosa “caixa de isopor”, semi-desativado, foi construído com capacidade para 130 presos e tinha mais de 300. O novo chegará aos 1.000, se o prefeito Athos Avelino não se manifestar de forma incisiva, como o fez o juiz Isaías Caldeira Veloso, repudiando sua utilização na política de “remanejamento” em curso.

(Waldyr Senna é o mais antigo e categorizado analista de política em Montes Claros. Durante décadas, assinou a ´Coluna do Secretário´, n ´O Jornal de M. Claros´, publicação antológica que editava na companhia de Oswaldo Antunes. É mestre reverenciado de uma geração de jornalistas mineiros, com vasto conhecimento de política e da história política contemporânea do Brasil).

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