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montesclaros.com - Ano 25 - sexta-feira, 20 de setembro de 2024
 

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Mensagem: (Do livro ´Por Cima dos Telhados, Por Baixo dos Arvoredos´ - Parte 4)

O NASCIMENTO DE UM AGLOMERADO URBANO NA PRIMEIRA DÉCADA DO SÉCULO XX

Tive a sorte de nascer pobre, na roça, e ali viver a infância. No começo era um diminuto grupo de pioneiros reunidos num espaço em que todos se conheciam, rodeados pelo mato. A rua era uma estrada de terra. A água era de cisterna, a luz de azeite de mamona e querosene. Não havia igreja, nem farmácia, nem médico. A escola pública, quando foi criada, anos mais tarde, ensinava apenas até o 2º ano. Chamava-se Escola Rural Mixta. Dela guardo meu diploma com carinho e respeito.
Naquele tempo não havia rádio nem televisão. Todo o tempo estava disponível para o trabalho e o convívio com as pessoas e a natureza. Foi didático. Vim aprendendo a viver a partir das mais profundas e legítimas raízes. De baixo para cima, envolvido pela natureza.
Sou batizado duas vezes. A primeira, três dias após meu nascimento, sob mal súbito, ante o risco maior, temido por minha mãe, de morrer pagão. Fui batizado pelo ferreiro do lugar, o senhor Bertolino Ponciano, homem de bem, temente a Deus, que lia a Bíblia. E a segunda vez pelo padre, tempos depois, quando o padre veio, na desobriga.

O COMEÇO

O povoado foi se formando aos poucos, ao lado da estação da ferrovia, em construção, numa região habitada por pequenos produtores rurais.

PIONEIROS

O Açougueiro

Cassimiro Jorge era o açougueiro. Não havia cortes especiais: era preço único. Ao freguês adulto ele mandava escolher. Se a mãe mandava uma criança fazer a compra ele mesmo escolhia a melhor carne disponível.

A Quitandeira

Dona Biló, esposa de “seu” Gaudêncio, fazia umas roscas morenas, redondas e graúdas, adoçadas com rapadura. Uma por um tostão. Eram boas demais.

O Cisterneiro

Neco Meirelles era o cisterneiro. Trabalhava sarilho abaixo, com uma pá cavadeira de mão e um enxadão de cabo curto, cavando a terra, 100 palmos ou mais, até chegar à água.

O Ferreiro

Bertolino Ponciano foi o primeiro ferreiro do lugar.

A Benzedeira

Era a velha Regina, esposa do José Bruno, irmão de João Gravetinho. Tinha reza e benzedura para tudo. A mim curou-me de um cobreiro de entrepernas (cobrelo). Rezou e benzeu em cima. Foi o mesmo que tirar com a mão.
O Raizeiro

João Velho conhecia as plantas. Sabia para o que serviam as folhas, as cascas e as raízes. E fazia sabão da terra com frutos de tinguí cozinhados em decoada de barrela de cinza.

A Parteira

Sia Clara, uma velhinha magra e esperta, de sorriso simpático, era a parteira. Contava histórias cantadas.

Que puseste, Juliana,
neste cálice de vinho
tenho a vista escurecida
não enxergo o caminho

Bate o sino da Matriz
quem será que hoje morreu?
Minha mãe, foi Dom Jorge
e quem matou ele fui eu.

( Da história de Dom Jorge e Juliana )

A Escola

Mestra Júlia teria 80 anos ou mais. Cabelos brancos, enérgica, ensinava a ler, escrever e contar em aulas particulares diurnas para crianças e à noite para adultos. Com a cartilha em uma das mãos e a palmatória na outra.
As 4 operações ela ensinava com a tabuada cantada: um mais um, dois; duas vezes dois, quatro; duas vezes quatro, oito; duas vezes oito, dezesseis, noves fora sete...

Os alunos faziam as anotações em lousas portáteis de ardósia, de duas faces, enquadradas em madeira, com lápis da mesma pedra.
“Seu” Trajano, o esposo, era curtidor de peles de animais silvestres, com tanino de cascas de barbatimão e angico.

A Venda

Meu pai era o vendeiro.

Pequenos Serviços

Militão não tinha emprego certo. Rachava lenha. Enterrava bichos mortos. Era feioso. Tinha os dentes grandes e salientes. E babava.
Na quaresma  o povo dizia  ele virava lobisomem.

Depois o tempo passou,
o lugar virou cidade
e tudo isso acabou.

(continuará, nos próximos dias, até a publicação de todo o livro, que acaba de ser lançado em edição artesanal de apenas 10 volumes. As partes já publicadas podem ser lidas na seção Colunistas - Luiz de Paula)

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