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montesclaros.com - Ano 25 - sábado, 23 de novembro de 2024
 

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Mensagem: ZÉ AMARO Bateu saudade de José Mário de Araújo. Ele sempre ia à minha casa, na Presidente Vargas, porque era amigo de meu pai. Essa amizade, suponho, deve ter nascido nos tempos em que o velho Nonô era sócio de seu irmão, meu tio Augusto Getúlio, na firma Vieira&Cia, ou seja, durante ou pouco antes dos anos 30, do século passado. No fim dos anos 50, adolescente, deliciava-me com aquele seu jeito espalhafatoso de falar: voz de timbre agudo, em tom elevado, intercalando entre as frases homéricas gargalhadas e finalizando-as com as interrogações “ouviu?” ou “tá ouvindo?”, que repetia e pronunciava “ourriu?” ou “tá orrino?”. Jamais esquecerei de sua botina “rangideira” marrom-glacê, de sua calça de brim e de suas belas camisas. De baixa estatura, barrigudinho, rápido em tudo, tão logo chegava alegrava qualquer lugar. Ele chamava Nonô de “Norica”. O que é a vida: duas décadas depois, Nonô faleceria nas mãos de Paulinho, competente cardiologista, filho de Zé Amaro. Eu estava junto, sofrendo a irreparável perda de meu pai. Paulinho chorou conosco, porque também gostava muito de Nonô. A gente herda os amigos de nossos pais. Quando eu tinha pouco mais de doze anos, Zé Amaro candidatou-se a vereador e dediquei-lhe a seguinte poesia, que foi publicada na “Gazeta do Norte”, jornal do inesquecível Jair Oliveira. Ei-la, com os retoques do tempo: Ele é um grande homem Candidato a vereador Em sua ilustre carreira Só falta título de doutor. É também negociante Político de coração E está bem convencido Que vai ganhar a eleição. Trinta votos garantidos O Zé Amaro já tem Mais oitenta ou cento e vinte Ele disse que inda vem. Quem votar em Zé Amaro, Aqui no nosso rincão, Gastará menos moedas Pra comprar o seu feijão. Zé Amaro conseguiu dar cama, comida e escola a sua filharada, tendo como atividade o comércio num armazém da Ruy Barbosa, ao lado do antigo Mercado. Inteligente, esperto, trabalhador e pai extremoso, deu a todos o maior conforto, moral e material. E como ele se orgulhava dos sucessos daquela inteligente ninhada! Alardeava-os aos amigos, naquela época em que as alegrias da vida eram muito mais compartilhadas. Fez um estardalhaço quando um passou no vestibular de medicina e outro foi aprovado nos exames da Academia Militar de Agulhas Negras. Quanto ao último, vaticinou logo: – esse será Presidente da República, “ourriu”? Há duas estórias que me contaram dele que são antológicas. Era compadre de Pedro Santos. O consultório de Pedrão ficava na esquina da Dr. Veloso com Padre Augusto. A sala de espera sempre lotada. Pedrão examinava as partes íntimas de sua esposa quando, de repente, Zé Amaro abriu a porta e disse, alto e bom som: – compadre, faça de conta que você está examinando sua própria mãe, “tá ourrino”? A outra é a dos penicos. Ele estocara muitos e não os vendera. Sabia que um colega comerciante não os tinha no estoque. Combinou com mais de dez meninos para irem, em espaços regulares e dias diferentes, mas seguidos, à loja do outro perguntar se tinha penicos. Livrar-se-ia, assim, de empacados urinóis, transferindo-os ao colega, que dele compraria, poucos dias depois, quase todos, para tentar revender, ante aquela inusitada procura. Zé Amaro deixou esta vida feliz e realizado. Embora tivesse fama de sovina, foi extremamente bondoso, sem alardear o bem que fazia ao semelhante. Eu o vi ajudar muita gente, especialmente os pobres e miseráveis. Tornou-se figura emblemática de minha aldeia, caricaturada por nosso fabuloso artista e médico Konstantin Christoff. Estórias tendo-o como personagem rodaram mundo. Hoje, certamente, estarão a circular em bem-aventuranças, onde ele deve ter encontrado muitos companheiros bons de prosa, que tiveram a felicidade conhecê-lo aqui embaixo. Que Deus o tenha, meu caro Zé Amaro! “Tá orrino”? *** Meu caro Raphael Reys.O que faço, quando os recebo aqui, é apenas em retribuição ao que vocês, “Imperadores do Divino”, fazem por mim quando vou aí rever minha mãe e matar um pouco da imensa e constante saudade da gente de minha aldeia.Que Deus nos permita repetir sempre esses indeléveis bons momentos de amizade e alegria! É isso que vale a vida!Muito obrigado!

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