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montesclaros.com - Ano 25 - sexta-feira, 27 de setembro de 2024
 

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Mensagem: Como a avenida Cel. Prates está na moda em Montes Claros, envio a crônica sobre a Igrejinha do Rosário da minha infância e adolescência.

A missa das 8hs, na Igrejinha do Rosário


Gosto de escrever sobre o lado humano da vida. Falar de pessoas, cheiros, sons e lembranças numa linguagem lírica que não resvala em momento algum para o piegas.Será que ser saudosista é defeito? Acredito que não. Abençoado daquele que tem uma infância e uma juventude feliz para contar.
Assim como “Proust”, tecia a malha de suas lembranças captando aqui um rosto, ali um perfume, uma cor, mais além uma reflexão de voz, no meu modesto tear também gosto de reviver o acontecido, bulir em águas paradas, abrir quartos fechados...
Muitos se foram, outros chegaram. As cidades são vivas. Estão em constante movimento. Os anos cinqüenta marcaram uma época romântica da história de Montes Claros. Entre o “footing” na Rua 15 e sessões de cinema, entre conversas no Café de Zim Bolão e horas dançantes no Clube Montes Claros, a vida seguia alegre e despreocupada.
Um dos locais onde as pessoas se encontravam para rezar era a Igrejinha do Rosário, na missa das 8hs. Naquela igrejinha de uma cidade encantada e amada, a que deram o nome de Montes Claros, percebi que aquelas pessoas que assistiam a missa eram como uma família se mantinham unidas pelos laços do coração. Em seu estilo colonial despojado, possuía uma nave central e em cada lado uma meia água. O campanário com o sino ficava na entrada principal. Domingo sem missa, não é domingo. A igreja enfeitada com flores naturais, a luz no altar refletindo nos arabescos dourados. Adentrando pela lateral direita ficava o reduto das mulheres e crianças, do lado esquerdo ficavam os homens e na nave as famílias em seus genuflexórios. Eu fazia parte da equipe da coleta. Era uma disputa. Todas queríamos fazer a coleta no lado masculino, pois a féria era infinitamente maior. Esse dinheiro era entregue às irmãs Lili, Iraci e Ana, conhecidas como trigêmeas, pois vestiam-se de maneira idêntica e com o maior esmero administravam a igreja.
O que eu menos fazia durante a missa era rezar. Observava tudo e todos. Estou vendo Carlotinha Versiani dos Anjos entrar em sua cama sobre rodas, acompanhada de Maria, na feliz expectativa de receber a comunhão. Neste setor ficavam também minha tia Teresa Dias, Oraide Novais e Lourdes Antunes Pimenta. Bonitas em seus vestidos de linho, discretamente maquiadas, sapatos Anabela, meias de seda, verdadeiras “ladies”. No lado masculino, entre os chefes das mais tradicionais famílias da cidade, o Cel. João Maia sentava em sua cadeira de balanço, vestido sempre de terno preto, cabelos e barba brancos, como um patriarca saindo do velho testamento em atitude de meditação. Os rapazes mais jovens assistiam a missa do lado de fora da igreja e aproveitavam para lançar olhares lânguidos às mocinhas. Na nave central, lembro-me das moças da família Rebello: discretas, educadíssimas e contritas. Encantava-me Dália Correia Machado, contrastando seus cabelos pretíssimos e sedosos com o batom vermelho vivo, sempre acompanhada de Teresinha Tupinambá e D. Bela Costa, exemplos de elegância clássica. Mais ao lado, vejo Alicinha Maia, lourinha, parecendo uma “teen-age” dos filmes água com açúcar da Metro.
Mas, a minha admiração era Dona Vidinha Pires vestida severamente: saia preta e blusa branca, com bolinhas ou estampados pretos. Sobre a blusa a Medalha Milagrosa de Nossa Senhora das Graças. No rosto uma leve camada de pó de arroz. Usava um maravilhoso anel de diamante, que, ao contato com alguns raios de sol, refletia pontos dourados no altar lateral. Mais que a beleza do anel, me impressionava o fato de ela usá-lo no dedo indicador, naquela época as senhoras usavam anéis apenas no dedo anular.
Vai começar a missa. A liturgia em latim, o cheiro do incenso, a música do harmônio criavam a atmosfera do mistério que envolve o sagrado. Padre Marcos, belga, de sotaque carregado, descrevia nos sermões os horrores do purgatório e do inferno. Depois foi substituído pelo Padre Quirino. Tão ameno! Tão bonito! Ele se parecia demais com o ator Gregory Peck naquele filme “As chaves do Reino”.
“Ite missa est”_ “Deo Gracias” respondiam os coroinhas. Na saída da igreja as famílias se cumprimentavam, combinavam o programa da noite. Em casa nos esperava o ajantarado de domingo: a deliciosa macarronada, o arroz de forno, tutu com lingüiça, frango assado e a cerveja preta Malzebier. Ah, esqueci: mil sobremesas a escolher.
Tinha vida melhor?

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