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Mensagem: Memória olfativa de Montes Claros As ruas, praças e becos de Montes Claros sempre tiveram cheiros peculiares, cheiros do passado que nos visitam em sonhos e dizem presentes ao chamado da saudade. Aromas eternos. Saindo para a escola na manhã ensolarada, começava todo um itinerário aromático. Primeiro era o cheiro das “Padaria Brasil” e “Santo Antônio”, assando fornadas e fornadas do pão de sal, inundando a vizinhança com o odor delicioso de pão novo. O próximo aroma vinha da torrefação do “Café Indiano” e do “Café Primor” nas ruas Cel. Prates e Viúva Francisco Ribeiro. A esse paraíso olfativo, seguiam ondas de odor fétido das matérias primas usadas pelo “Curtume Montes Claros” na industrialização do couro. O mau cheiro ia desaparecendo no corredor do Melo, cujos estábulos e árvores – frondosas mangueiras – principalmente davam a impressão de mergulhar numa fazenda. Das residências da cidade, a maioria com jardins onde vicejavam roseiras, cravos, dálias, surgia o cheiro de calda de açúcar, da carne assando, do bolo no forno, da baunilha, do cravo e da canela... Ao passar na porta da Farmácia de seu Mário Veloso sentia o cheiro de álcool, do éter e iodo lembrando machucados e dores. Subindo a avenida Francisco Sá em direção a Estação da Estrada de Ferro Central do Brasil, sentia-se uma mistura do perfume de eucalipto e fumaça dos trens de ferro a vapor, com lenha queimada ou carvão mineral. As carroças que rodavam em suas ruas espalhavam o cheiro do suor do animal, às vezes acrescidos de excrementos deixados pelos burros ou cavalos. Os carros de boi, na sua cantoria deixavam escapar o cheiro de lenha recém –cortada. Sábado, é dia de feira. No mercado municipal, centenas de odores se misturam, deixando no ar um perfume inesquecível; carne de sol, beijús, farinha de mandioca, milho tenro na espiga, cominho e coentro moídos na hora, casca de laranja-da-terra prontinha para virar doce. Tudo isso, mais cajás-mangas, pañas, jambo, murici, verduras e legumes frescos ainda molhados de orvalho. Caldo de cana, queijos, requeijões, cachaça, rapadura e todos os aromas do sertão. À partir de novembro, o cheiro do pequi, fruto-rei do cerrado invade a cidade com seu perfume intenso e amarelo vibrante. As primeiras chuvas batendo no telhado e na terra poeirentas, emanavam o perfume acolhedor de terra molhada, enchendo de esperança ô coração do sertanejo. A noite chegava devagar e o jardim da praça Dr. Chaves era uma festa de odores, aromas e fragrâncias. O ar cheirando a jasmim, manacá e dama da noite. Na rua Simeão Ribeiro o cheiro de pipoca na porta do Cine São Luiz, e , ao lado no Café de Zim Prates, o cheiro do biscoito de farinha, feito por Dona Pretinha – o melhor que já comi na vida – e hoje ainda existe pelas mãos abençoadas de Nazaré Prates. No “footing” da Rua 15, os perfumes L’emant, Lorigan, Promessa, Flor de maçã, Miss France, Madera do Oriente, se misturavam aos cheiros de Brilhantina Coty, Gostora e sabonete Libeboy dos rapazes. Perfumes singelos, sedutores exóticos, eróticos... Paisagem, aromas, odores, sons e cores foram um pano de fundo de minhas vivências, e os invoco em minhas solidões. Eles me fazem companhia, principalmente quando sinto o mundo amedrontado, dolorido, em pânico. Nasce então uma saudade imensa do tempo que passou, da vida simples, do tempo que Montes Claros tinha “alma de aldeã”. Os odores naturais foram sendo substituídos pelas substâncias industrializadas. As padarias continuam até hoje a marcar território. O cheiro de pão novo aquece a alma e agrada o estômago, mas os carros e os ônibus criam barreiras contra os cheiros das cidades. Volto a tempos tão distantes e diferentes. Aspiro no ar diáfano todos esses aromas embriagadores. O coração bate mais forte. Arrebatamento. E isso, tem o nome de saudade...
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