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Mensagem: DO NATAL NÃO COMPREENDIDO<br><br>Jamais consegui sentir a azáfama da proximidade do Natal como tempo de alegria. Talvez por ter-me faltado na infância a compreensão do Natal barroco, apenas contemplativo, sem a agitação desse inventado agora.<br>Lembro-me, vagamente, de respeitosas, misteriosas e difíceis “missas do galo” a que nunca fui. Eram sempre à meia noite e as meias noites eram para o sono da infância e alguns poucos sonhos entre pesadelos atribuídos à ação das lombrigas. Depois, na juventude, o Natal se limitava a presépios feitos com caixotes cobertos por jornais amassados e colados, depois pintados com tinta preta, para ficar parecendo pedras. Quase todas as casas mantinham as portas escancaradas, para que fossem vistas as “lapinhas” artificiais, sempre repetidas, que desapareciam tão logo a noite chegava à cidadezinha onde não havia luz elétrica. Candeeiros de querosene, perto de papel pintado e capim seco, costumavam labaredar quando ventava e não eram aconselháveis. Velas não havia ou custavam caro.<br>Por isso, as desbotadas imagens de gesso representando o menino, seus pais, o burrinho e a vaca (a coitadinha sempre deitada), somente podiam ser vistas durante o dia. Havia o luxo de canteirinhos de terra feitos dentro de uma bacia e semeados no tempo certo com arroz para nascer a partir de 20 de dezembro; e um lago pequenininho, em que a água era representada pelo espelho redondo de bolso, dos que eram usados para se pentear os cabelos com brilhantina. A não ser isso, os presépios eram enfeitados com a fruta da época, a pitomba.<br>Pitombas enormes, que interessavam ao apetite da meninada; costumava-se pedir, umazinha só, à dona da casa, para sempre receber a mesma resposta: “Pode não! As pitombas são do menino Jesus”. E não havia alegria na constatação de que a gente era apenas menino de verdade, com vontade de comer pitomba, e as pitombas eram para o menino de gesso que nem as podia provar.<br>Mais tarde viria a explicação do porquê desse Natal simplezinho, e dos outros: devia ser a comemoração do nascimento do Salvador, representado por<br>aquela miniatura de menino. E essa versão, também, não trazia alegria, e explico: a gente começava a raciocinar e ficava intimamente entristecida pela inevitável ligação do Natal com a Paixão que viria logo a seguir. O nascimento era comemorado como festa, já sabendo de antemão que o Deus menino estava destinado a ser traído, torturado e assassinado lentamente em uma crucificação. E surgia a pergunta considerada atéia, mas inevitável: o Deus onipotente não poderia, Ele próprio, acabar com os pecados todos, fazendo um simples gesto de misericórdia, sem necessidade de morrer na cruz? À falta de resposta, restava a tristeza de não ter a explicação do inexplicável.<br>O tempo foi passando, as coisas pareceram mudar, o poeta até perguntou o Que havia mudado: se ele, ou o Natal. E milhares de bobocas, pelo País afora, repetiram, ano após ano, essa pergunta como se fora a solução do problema da insatisfação humana. O que em verdade interessava entender era porque o Natal ingênuo da manjedoura se havia transformado na festa de ostentação do Papai Noel barbudo e histriônico. E porque no lugar das pitombas, sempre negadas, se davam agora tantos presentes a todos. E porque alguns podiam comer e beber tanto quando, nas famílias pobres, as criancinhas choravam. Porque essa alegria da fartura possibilitada pelo dinheiro, e a tristeza dos sem Natal. Como poderia esse contraste ser o símbolo do nascimento, da vinda da salvação de todos.<br>Por certo, não havia mudado o Natal nem mudaram os homens. Não houvera transformação quanto ao desentendimento do essencial. Nessa noite de sinos, luzes e enfeites o que se comemorava, e na verdade se comemora, eram e são os bens do mundo, os prazeres do egoísmo; e a permanecia do tradicional esquecimento dos que sofrem.<br>Para nós, que estamos assentados em sofá macio, a televisão estará anunciando um fantástico Natal sem fome, o Natal dos Sonhos, falso descarrego de consciência. Um dia no ano com menos de miséria e outros 364 dias de esquecimento, de revolta, de marginalidade criminosa.<br>Eu não posso, sei que não devo - acho que ninguém pode e não deve - fugir dessa tristeza no Natal. A tristeza de reunir a família, os filhos e os netos em torno de uma mesa, de uma árvore com enfeites e luzes, cercada de presentes, fazer algumas orações da boca para fora, e sentir no artifício<br>das gargalhadas a falta da misericórdia que essa data devia simbolizar.<br>Quando nos falta, a todos, a certeza do verdadeiro espírito do Natal, está faltando o significado do advento que deve ser a preparação da Paixão e da Páscoa. Enquanto não houver o espírito de com-paixão, nenhuma festa será justificativa para a alegria. Anuncio e certeza da crucificação, o Natal precisa ser entendido como promessa de ressurreição da carne. A carne que é fraca e somente o espírito a pode fortalecer.
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