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montesclaros.com - Ano 25 - segunda-feira, 25 de novembro de 2024
 

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Mensagem: PAPAI NOEL, ´VELHO ADULADOR´

As nossas recordações da infância são como lindos brinquedos que possuímos e que, por descuido, caíram de nossas mãos e se quebraram, ficando para sempre guardadas como lembranças queridas, em nossos corações.
Passam-se os anos e, com eles, somos levados como joguetes do destino e, sem sentir, envelhecemos. E eis que um dia surge em nossa imaginação a lembrança querida e saudosa de certas passagens inesquecíveis da nossa infância ou de nossa juventude.
A princípio, como uma tênue fumaça, açoitada pela saudade ela cresce e se reacende como uma brasinha ao leve sopro da brisa... E assim é que hoje, no outono da minha vida, eu sinto uma saudade, ela cresce e se reacende em minha mente reminiscências de minha infância.
Montes Claros era uma cidadezinha triste, escura, naquele tempo em que não existiam os bonitos automóveis de hoje, e desconhecia por completo o conforto que nos traz a civilização.
Ao invés disto os carros-de-bois sulcavam as ruas já esburacadas e estreitas, deixando atrás de si, aos nossos olhos, o rastro sinuoso de suas grosseiras rodas de madeiras e em nossos ouvidos a música lamuriosa e triste de seu cantar.
Como tudo isto está longe!
Não possuíamos os brinquedos fantásticos de hoje, verdadeiras obras de arte e aprimoramento. Contentávamos apenas com os bois de sabugo; os cavalinhos de pau e as caricaturas de caminhões fabricados pelos presos da cidade, de colorido berrante, mas que alegravam a criançada daquela época.
Em casa, éramos uma família feliz, onde sete irmãos cresciam despreocupadamente, como certas plantas o fazem, viçosas, brilhantes, graças à Providência Divina. Não éramos ricos, entretanto, isto nunca nos preocupou nem turbou a tranqüilidade do nosso lar, pois, pouca gente, ou talvez nenhuma se preocupava com as cifras!
Tínhamos, também, o nosso Natal, porque o Natal é privilégio de todos e sempre existiu. Com ou sem civilização, o Menino Jesus foi sempre desejado e esperado, com festas, em todos os lares pobres ou ricos. E a festa universal, em que todas as crianças, desde a miserável do morro, que nem sempre tem o que comer, até as nascidas em berço de ouro, esperam o Papai Noel, ansiosas, na esperança de um presente, principalmente um brinquedo.
E foi assim, nesta ansiedade que eu fui me deitar, numa longínqua noite de Natal, colocando à beira da minha cama meu sapato bem em frente à porta para que o bom ´Velhinho´ o visse logo à entrada.
As horas corriam vagarosas e a impaciência e a emoção não me deixavam dormir. Eu sentia uma grande alegria, mas era uma alegria medrosa, e preocupava-me, na minha ingenuidade, como o Papai Noel entraria com todas as portas fechadas.
Enquanto a cidade dormia tranqüila, pobre cidade do interior, somente o relógio antigo do Mercado, na Praça Dr. Carlos, quebrava, de vez em quando, a monotonia angustiante daquela noite, com suas badaladas compassadas, eu pensava em ti, meu Papai Noel. E que sensação boa invadia-me ao ouvir aquele sinal de vida na noite silenciosa. Ouvindo-o, tinha impressão de que não estava sozinha, que existia um companheiro de longe, guardando-me.
E que saudade eu sinto, ainda hoje, de ti, que tantos anos guardastes, minuto por minuto, esta terra querida. Foste o vigia incansável, despertando alegremente as crianças para a escola e os homens para o trabalho!
Quantas vezes os valentes tropeiros, a teus pés descansavam, depois de árdua viagem em lombo de burro e despertavam com o seu badalar amigo? Não foste sempre um amigo fiel? E em recompensa desprezaram-te, arrancaram-te da Praça. Por quê?
Tu anunciavas a chegada de Papai Noel e eu te queria muito bem e ouvindo tuas badaladas adormeci profundamente feliz. Acordei, no dia seguinte assustada, enquanto meus irmãos chamavam-me. Senti uma alegria enorme ao ver que o Papai Noel não se esquecera de nós. Olhei o meu sapato, lá estava um embrulhinho transparente, onde pude ver - não era brinquedo o que ganhávamos, mas balas coloridas, lindas balas de estalo!
Ignorávamos, entretanto, quanto custara a mamãe o esforço de proporcionar-nos a alegria de ter também um presentinho em nossos sapatos...
E estávamos ainda enlevados com o acontecimento quando, de repente, entram correndo no quarto minha maior amiga de infância e seu irmão, vizinhos que moravam num velho sobrado da praça. Ela trazia nos braços uma boneca enorme e linda, de cabelos longos e loiros, grandes olhos azuis e chapeuzinho de palha dourado, e ele com um cinturão com dois bonitos revólveres tipo ´cow-boy´ todo incrementado. Tudo tão bonito, que o Papai Noel lhes trouxera!
Na nossa pouca idade, nunca poderíamos entender o ´porque´ daquela desigualdade de presentes, e acreditávamos ser o ´Velhinho´ o único responsável.
Vi logo (não menosprezando nossos comerciantes daquele tempo) que aquelas maravilhas não poderiam ser da loja de Sio Carlito dos Anjos, Chico Peres, nem da Casa Cocó...
E foi então que vi meu irmãozinho caçula, de olhos presos aos nossos vizinhos e aos brinquedos, atirar seu pacotinho de balas no chão, dizendo, cheio de ressentimento:
- Papai Noel é um velho adulador, só traz brinquedos bonitos para os meninos ricos! Vai puxar saco no inferno!
Naquele instante, todos olhavam para a mamãe, que vinha aflita ver o que acontecera. A cena chocou-a. Seu sacrifício fora inútil. Os meninos ricos, inocentemente, e sem querer, estragaram nosso humilde Natal.
Corri para abraçá-la e beijar aquelas santas mãos. E jamais, em toda minha vida, poderia me esquecer da expressão triste de seu olhar, e as duas lágrimas que corriam pelas suas faces.

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