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montesclaros.com - Ano 25 - segunda-feira, 25 de novembro de 2024

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Mensagem N°9999
De: Flavio Pinto Data: Segunda 9/1/2006 10:49:31
Cidade: Belo Horizonte

PRAGA DE NORTE-MINEIRO

Para todos aqueles que nos proporcionaram e contribuíram para a sublime
desventura e vergonha de chegarmos a este ponto, de ter que nos sujeitarmos
ao pagamento de um espúrio pedágio para ir além dessa placa , nesta outrora
linda estrada asfaltada (que já foi nosso orgulho) conseguida a duras penas
e pedida até em versos pela nossa fina flor musical...

...Para todos esses que esconderam e desviaram as verbas de
manutenção/conservação da nossa estrada, agindo tal e como desequilibradas -
e foras de moda - primas donas , em longas e particulares saias-justas de
prejuízo completo ao bem público de nossa comunidade norte- mineira...

...Para todos eles, que o povo sabe muito bem quem são : eu, modesto
escrevinhador deste Mural, vendo impedido - não pelos ínfimos dez contos em
si, mas pela simbologia histórica que representa - o meu livre caminhar, o
meu ir e vir normal de toda a vida para a minha terra, para o meu sagrado
canto no mundo, que eu tanto amo;

Para aqueles, para esses e para eles, eu dedico estas palavras de Dante
Alighieri ( e o lugar também ), da sua imortal obra "A Divina Comédia":

"CANTO XXI -Vala dos corruptos - Malebranche (demônios)

De cima de outra ponte paramos para ver a próxima fissura de Malebolge, que
era incrivelmente escura. Lá embaixo um grosso breu fervia. Eu olhava mas
nada via a não ser as bolhas de piche que a fervura levantava. Enquanto meus
olhos procuravam alguma coisa naquela escuridão, meu guia gritou:
- Cuidado, cuidado! - e logo me arrancou do lugar de onde eu estava.
Voltei-me e vi logo atrás um diabo preto que corria em nossa direção. Ai,
mas como ele tinha um aspecto feroz! Com suas asas abertas ele corria
ligeiro com os pés. Levava um pecador no seu ombro pontiagudo, que pelos
tendões dos pés tinha seguro. Parou diante da pez fervente, e gritou:
- Ó Malebranche, aqui está mais um daqueles anciões devotos de Santa Zita.
Cuida dele pois eu vou buscar outros. Quase todos naquela terra são
corruptos, exceto, é claro, Bonturo! Lá, com dinheiro, qualquer não vira um
sim.
Depois que falou, soltou o pecador das alturas, que submergiu no líquido
espesso. O diabo voltou correndo pelos recifes e sumiu na escuridão. O
pecador ainda tentou ressurgir na superfície, mas vários demônios que
estavam sob a ponte saíram e o perfuraram com mais de cem garfos, levando-o
a outra vez submergir".


Abraços a todos, menos estes ...

Flavio Pinto

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Mensagem N°9893
De: Oswaldo Antunes Data: Quarta 4/1/2006 11:28:16
Cidade: Montes Claros

A VIDA LEVE
Oswaldo Antunes

No ultimo dia do ano, o amigo, sobrevivente como eu, Konstantin Christoff, telefonou direto para a mesa em que escrevo. Insiste em que devo escrever crônicas mais leves. Usar isopor em vez de martelo. Depois, mandou-me um livro de Millôr Fernandes que ironiza outros dois: o empolado "Dependência e Desenvolvimento da América Latina", de Fernando Henrique Cardoso, e o intrincado "Brejal dos Javas", de José Sarney. Competir com Millôr ou imita-lo não convém. Culto e inteligente, ele escreve para quem tem o mínimo de entendimento do que seja a ironia, o elogio com segundo sentido. Mas o jornalista tem obrigação de se fazer entender por todos. Concordo que a crônica deve ser agradável e não estressante. Não obrigatoriamente humorística. Fazer a abordagem do cotidiano com um mínimo de poesia é bom caminho para o entendimento geral, porque poesia de verdade quem não entende sente. O que faz lembrar duas mulheres especiais: Cecília Meireles, que parece mediária entre o divino e o humano, e Cora Coralina, a poetisa da simplicidade. Conhecida pelo pseudônimo, Cora se chamava Ana Lins do Guimarães Peixoto Brêtas. Viveu no anonimato, e, já idosa, Carlos Drummond de Andrade leu suas crônicas e publicou esse recado: "Cora Coralina. Não tendo o seu endereço, lanço estas palavras ao vento, na esperança de que ele as deposite em suas mãos. Admiro e amo você como a alguém que vive em estado de graça com a poesia. Seu lirismo tem a força e a delicadeza das coisas naturais". Bastou essa fala simples do poeta federal para colocar na visão do Brasil todo a mulher que era tantas outras ao transformar em beleza o cotidiano. Moça, ela conheceu um advogado divorciado, fugiu, casou e teve seis filhos de sangue. Os outros filhos, seus livros, pouca gente conhece. Como desconhece o sensível e imaginário "Flor de Poemas" de Cecília. Reencontrei "Estórias da Casa Velha da Ponte", de Cora, em um sebo, na véspera do Natal. Tem o carimbo da biblioteca da Escola Estadual Dom Aristides Porto, mas foi parar na pechincha, a custo de vintém. Ao reler, revivi a emoção de Drummond: "Minha querida amiga Cora Coralina: ... sua poesia é das mais diretas e comunicativas que já tenho lido e amado. Que riqueza de experiência humana, que sensibilidade especial e que lirismo identificado com as fontes da vida!" A vida fica mais leve se, para começar o ano, o leitor sentir na própria experiência, nos momentos discordantes de tristeza e alegria, a poesia que ajuda a cavalgar até a origem do Mistério. Se toda gente cantar, porque o instante existe e a vida está completa. Se irmão das coisas fugidias, não ser alegre nem triste, ser poeta. Aceitar as noites, os dias, o vento. Cantar antes que venha o sono.

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