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montesclaros.com - Ano 25 - quinta-feira, 28 de março de 2024
 

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Mensagem: LAS BELLES DE JOUR As aulas no Colégio São José terminavam depois das 11 horas da manhã. Quase diariamente eu descia a rua Belo Horizonte até a igrejinha e pegava a Padre Augusto, um caminho mais longo para ir para casa. O trajeto normal, mais curto, era pela D. Pedro II ou pela Dom João Pimenta, pois eu morava ao lado da Santa Casa, mas o baixo meretrício, situado num pedaço da rua Padre Augusto, me atraia magneticamente. Logo na descida dessa rua, depois da casa da família Urze de Almeida, estabeleciam-se uns ferreiros que colocavam ferraduras nos animais. Um deles era o temido Exupério Ferrador, o Bigode de Arame, que eu morria de medo, pois corria a lenda que ele tinha sido cangaceiro de Lampião e como jagunço havia participado ativamente do tiroteio de 1930, por ocasião da tumultuada visita de Melo Viana. O ambiente era tosco, o chão batido, sem nenhuma cobertura, uns poucos troncos e sempre meia a uma dúzia de burros e cavalos encabrestados à espera da calçadura. Eu passava a passos largos. Transposta a esquina da Pires de Albuquerque, a rua era toda grudenta, pichada de preto pelos dejetos dos óleos queimados pelas locomotivas diesel da Cemig. Eram imensos geradores de energia, alinhados de dois a dois, em cada lado da rua. Um barulho medonho e um cheiro de fumaça de caminhão. Na minha imaginação infantil, sentia-me no futuro, numa embaçada metrópole, intoxicado pela fumaça, pelo fedor e pelos ruídos das monstrengas máquinas. Os misteriosos lupanares vinham logo a seguir. Eu pegava o passeio da direita, diminuía o ritmo das passadas, o coração disparava, num tum-tum que faltava sair pela boca. Tomava fôlego, levantava lentamente a cabeça e a girava em direção à casa de Roxa, no intuito de registrar fotograficamente tudo o que ocorria no prostíbulo. O olhar cirúrgico era esmiuçador em busca de putas ou de parte delas: coxas, calcinhas, bundas, bocas, peitos, sutiãs, batons numa obsessiva coletânea de imagens e fantasias para o bom uso e devaneio logo que chegasse em casa. Fotografado pelo olhar e feito o registro do primeiro bordel, morrendo de medo de ser zombado por algumas das putas, partia para o segundo que, salvo engano, era o de Miana. Deslocava-me, trôpego, atravessando todos aqueles ruídos, palavrões, gargalhadas de putas e a música alta, lembro até de um bolero recorrente de Altemar Dutra, “sonhei/ que tu estavas tão linda/ numa noite de raro esplendor”, e concentrava-me para colher, mais uma vez, com a apurada visão, quaisquer partes ou detalhes que me despertassem, em casa, a sós, lúbricos e pecaminosos desejos. Envolto naquele burburinho da rua e no meu redemoinho interno, prosseguia para passar pela porta do terceiro prostíbulo, o de Geralda Brejeira, minha última chance de mirar e satisfazer meu sonho cotidiano: uma puta peladinha, estalando gostosura, tilintando nudez, sorrindo, com os peitos, a vergonha e os tufos de cabelos à amostra, para eu morrer feliz no hedonismo mais carnal. Pronto. Passou o derradeiro cabaré. Atravessei o devasso caminho. Dessa vez, meus clics olhares registraram uma perna em cima de uma cama ou sofá, uma anágua e uma calcinha dependuradas no varal de um quintal e um magistral meio peito, com o bico quase pulando do sutiã de uma puta que fumava no pequeno alpendre de uma das casas. Ela olhou e piscou pra mim, quase me despiu com a piscadela. Aquele sinal com os olhos tinha mais devassidão que todas as minhas fantasias. Ela ia se ver comigo mais tarde. De posse das imagens captadas, debulhava-as na mente, sem dar mais bolas para os demais quarteirões, para o beco que cortava a Padre Augusto e para os seus comércios. Tudo passava despercebido: a transportadora, o armazém dos irmãos José Maria e João Melo, o moinho de Zé Vieira...

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