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montesclaros.com - Ano 25 - segunda-feira, 23 de setembro de 2024
 

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Mensagem: S.O.S para o nosso Carnaval Ruth Tupinambá Gente o carnaval passou e não vimos nem notícias pelo jornal. Num silêncio profundo ele desapareceu. A cidade ficou vazia e triste. Nossos foliões foram todos procurar distração nas cidades vizinhas, pois ninguém é de ferro. Temos que jogar fora os aborrecimentos, desopilar o fígado, dar basta ao “estresse”. O carnaval é festa universal é a festa de todos e sempre existia. É a festa em que todos se misturam: pretos e brancos sem distinção de castas, pobres e ricos, jovens e velhos, crianças e adultos, cujo único objetivo é pular, dançar, cantar, se distrair botando para fora todos os aborrecimentos, recalques, preocupações, resultados da luta pela sobrevivência, que hoje não está fácil. Para afogar minhas mágoas, liguei a televisão e fiquei admirada! As cidades vizinhas todas tiveram o seu carnaval animado. Desde a mais simples, menores e mais pobres cujos cofres deixam muito a desejar, mas têm uma administração consciente e um povo que sabe o que quer e luta para consegui-lo. O ano passado o nosso carnaval vivia. Estava fraco mas ainda “respirava”... mantido apenas pelo fôlego da população. As verbas destinadas para este fim desaparecem... mas elas existem. Finalmente este ano conseguiram enterrar o nosso carnaval. A nossa cidade está em crise. Ela que começou no Arraial de Formigas e se transformou numa rainha! Cuidado montesclarenses e responsáveis pela sua administração. Não deixem a “coroa” cair. Não deixem que, o Aedes Aegypti (mosquito da dengue) se aloje para sempre no coração da nossa Rainha. Que a violência cresça mais e os bárbaros assassinatos se multipliquem. Que o nosso folclore tão lindo, admirado e respeitado se enfraqueça. Que a cidade da cultura e rainha do Norte de Minas se transforme em “Rainha do lixo”. Ressuscitem também o nosso carnaval para alegria do povo. Cristo não ressuscitou Lázaro? O carnaval sempre existiu e graças a ele com sua alegria muito beneficiou seus foliões. Eu me lembro ainda do meu tempo de jovem o carnaval era a festa mais esperada na década de 20, 30. e até 40 ... A cidade era pequena, pobre, comunicação difícil, os cofres da administração não recebia verbas avultadas mas existia calor humano e verdadeiros foliões e o carnaval era um sucesso. O povo se distraía e era feliz. A nossa cidade foi durante muitos anos dividida e governada por dois partidos políticos; o dos moradores das ruas de Cima e o dos moradores das ruas de Baixo. Eram os Estrepes e os Pelados. A rivalidade entre eles era notória se refletindo em todas as nossas celebrações sociais, políticas e religiosas. Era tudo separado, “cada macaco em seu galho” como diziam eles. Quando a folia do Rei Momo se aproximava começavam as animosidades entre os partidos. Cada qual queria mostrar mais o seu prestígio e o seu potencial mas no fim todos se misturavam e nada atrapalhava as festas do Rei Momo. Formavam-se os blocos, os de Cima e os de Baixo e os foliões começavam agir. Os ensaios eram animadíssimos, cada partido fazia sua própria música. Os foliões de Baixo sob o comando das famílias: Prates, Costa, Novaes, Oliveira, Fróes, Teixeira, Mendonça, Maurício, Guimarães, Tupinambá e outras.; tendo a frente Ary de Oliveira (irmão do saudoso Jair de Oliveira) com grande experiência das Capitais, arranjando e decorando os carros alegóricos, bolando canções e fantasias. Do lado de Cima também tinha os seus animadores destacando-se as famílias: Ribeiro, Veloso, Anjos, Labonorte Vale, Alves, Maurício, Viana, Miranda, Peres, Sarmento, Fernandes, Pimenta, Ferreira de Paula e outras. A entrega da chave da cidade ao Rei Momo era um acontecimento, e ele, com muito orgulho, tomava conta da cidade carnavalesca, nos 3 dias. O comércio e as escolas fechavam-se para que todos pudessem tomar parte. Os Pierrôs e as Colombianas se multiplicavam. Durante o dia os blocos e os Corsos carnavalescos, com suas alegorias e fantasias interessantes, num bonito desfile, nas principais ruas da cidade coloridas pelos confetes e serpentinas e o lança perfume excitantes embriagava os foliões. Havia concurso dos blocos fantasias, músicas e carros alegóricos. A disputa era forte, mas nesta hora, nada de política, o juiz era imparcial. Ainda me lembro dos nomes de alguns blocos; os Malandros, Palhaçada, Morena Fogosa, os Marechais, Calça Furada, Balança mais não cai. Os mais famosos e com carros mais bonitos eram: Mulher engraçada e adorada (dos de Cima) e Eu vou se você for (dos de Baixo) e a disputa era tremenda. Havia também no desfile, fantasias interessantes, extravagantes. Palhaços estilizados exibindo piruetas e malabarismos, outros com máscaras, dando largas aos recalques nos gestos e trejeitos pornográficos. Naquele tempo não se viam gays e travestis, se realmente existiam, eram muito discretos e escondidos. Mas imitando o carnaval das grandes capitais, alguns mais audaciosos se vestiam de mulher mostrando as pernas cabeludas, num saldo alto, a peitaria postiça aparecendo num “soutien” improvisado, balançado-se ao som da música, rebolando um bumbum desajeitado. Era uma admiração e um escândalo!... As betas se escandalizavam fechavam as janelas faziam o sinal da cruz. Mas não adiantava, os foliões queriam se distrair e a folia continuava quente. À noite os bailes à fantasia aconteciam prologavam-se até o amanhecer. Com aplausos, gritos e muita euforia elegiam a rainha do carnaval que muito emocionada recebia a faixa e a coroa das mãos da sua antecessora. O Rei Momo depositava na mesa da comissão apuradora, a chave da cidade, que no ano seguinte cairia nas mãos de quem governaria a cidade carnavalesca. Quarta-feira de Cinzas tudo acabado. Mas ao raiar do dia, se ouvia ainda pelos cantos das ruas no meio dos confetes e serpentinas (retratos de um fim de Carnaval) num resto de pileque, as vozes roucas de pierrôs frustrados pela traição das “maldosas colombianas”, nos delírios carnavalescos: Um pierrô apaixonado Que vivia só cantando Por causa de uma colombiana Acabou chorando, acabou chorando... É isto aí! Montes Claros já teve o seu carnaval durante muitos anos e bom demais. (N. da Redação: Ruth Tupinambá Graça, de 94 anos, é atualmente a mais importante memorialista de M. Claros. Nasceu aqui, viveu aqui, e conta as histórias da cidade com uma leveza que a distingue de todos, ao mesmo tempo em que é reconhecida pelo rigor e pela qualidade da sua memória. Mantém-se extraordinariamente ativa, viajando por toda parte, cuidando de filhos, netos e bisnetos, sem descuidar dos escritos que invariavelmente contemplam a sua cidade de criança, um burgo de não mais que 3 mil habitantes, no início do século passado. É merecidamente reverenciada por muitos como a Cora Coralina de Montes Claros, pelo alto, limpo e espontâneo lirismo de suas narrativas).

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